Que as mulheres são poderosas, não há a menor dúvida, tanto que as questões que envolvem o feminino são cada vez mais recorrentes e discutidas nos dias atuais. Só o fato de gerar a vida, dar à luz, já nos torna seres excepcionais desde sempre. E, sobretudo por isso, por essa condição especial, deveríamos ser mais respeitadas.
O que nos causa espanto é que, quanto mais se alardeia o poder da mulher, o chamado “empoderamento”, termo tão em voga atualmente, mais ela se torna vulnerável quando se trata das relações amorosas e familiares. Diariamente, somos informados pela grande mídia, sobre agressões sofridas pelas mulheres, muitas fatais, perpetradas pelos próprios companheiros (maridos, namorados, amantes, ficantes o que sejam).
Sim, porque é no seio familiar, nas relações que deveriam ser afetivas, que elas encontram os seus mais cruéis algozes. O feminicídio, como é denominado o homicídio contra as mulheres, está se tornando cada vez mais corriqueiro, invariavelmente por motivos banais. O ciúme é quase sempre o fator desencadeador.
O grande índice de assassinatos de mulheres não se trata de um problema isolado. Representa, na verdade, sintoma de um padrão de violência de gênero contra elas em todo o país. Do ponto de vista histórico brasileiro, a violência contra a mulher é herdeira de uma cultura com raízes em uma sociedade escravocrata, construída a partir do modelo colonizador que aqui se instalou, segundo Marcondes Filho (2001).
Também contribuem para o aumento da violência contra a mulher valores machistas profundamente arraigados na sociedade brasileira, conforme documento publicado pela Comissão Interamericana de Direitos humanos (CIDH). Ainda segundo a organização, somente no início deste ano, 126 mulheres foram assassinadas no Brasil em razão do seu gênero. A situação exige do Estado medidas mais severas, tais como investigações sérias e punição aos culpados.
O que nos deixa extremamente chocados é que esse tipo de crime já se tornou banalizado. É como se a vida, esse bem maior que nos foi concedido, não valesse mais nada. Hoje, se matam mulheres como se fossem insetos, e o que é mais lamentável, muitas vezes na presença dos próprios filhos. E não venham me dizer que isso só acontece nas camadas mais baixas da população, na periferia. Não mesmo, acontece também nos condomínios de luxo, entre pessoas bem sucedidas financeiramente e com bom nível de instrução.
É certo que a mulher vem contabilizando muitas conquistas, tanto no plano pessoal como no profissional. Alcançou a tão sonhada liberdade, conquistada palmo a palmo, para se tornar uma pessoa produtiva, independente, não mais aquela senhora do lar – não que isso seja demérito para quem faz essa opção, até porque o direito de escolher faz parte da pauta contínua da luta feminina . Talvez isso incomode os homens em geral, não todos, obviamente. Numa sociedade patriarcal como a nossa, deve ser difícil para muitos conviver com essa nova mulher.
Se voltarmos os olhos para tempos mais distantes podemos observar que a mulher não sofria tantas agressões, ou pelos menos não se tinha conhecimento. Os dias corriam entre os afazeres domésticos, o cuidar das crianças e a atenção para o marido, o provedor da família. Mas os tempos mudaram, a mulher se profissionalizou e vem disputando com muita garra o seu lugar na sociedade. É bem verdade que ainda há um longo caminho a percorrer nessa caminhada pela igualdade de condições entre os dois sexos, sobretudo no que se refere a hierarquia e funções.
O mais assombroso e ao mesmo tempo alentador “é comprovar que sempre houve mulheres capazes de sobrepor-se às mais penosas circunstâncias, mulheres guerreiras, aventureiras, criadoras, políticas, cientistas, que tiveram a coragem e a habilidade de escapar a destinos tão estreitos como um túmulo”, no dizer da escritora espanhola Rosa Montero. São essas incontáveis facetas do universo feminino que nos trazem a esperança em dias melhores. Esperamos que sejam.
Socorro Pitombo é jornalista
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