por Socorro Pitombo
Que eu me lembre, nunca estive em um estádio de futebol, nem mesmo para assistir a um daqueles mega shows musicais, quanto mais para ver a bola rolar no gramado. Quando menina não fui estimulada a praticar esportes. Ir ao estádio muito menos, era coisa pra homem, o preconceito falava mais alto. E assim foi pela vida afora.
Herança, com certeza, de um tempo não muito distante em que as mulheres eram proibidas de jogar futebol, ou melhor, de praticar qualquer esporte que fosse contra sua natureza. Acreditava-se então que, ao proibir a sua participação em esportes mais violentos – e o futebol era considerado um deles – estava se preservando o corpo da mulher e até mesmo a sua fertilidade.
Já adulta, atuando como repórter da Sucursal do Jornal da Bahia em Feira de Santana, tinha a obrigação de fazer a cobertura esportiva. Aí entrei em pânico, o que fazer se eu não entendia nada de futebol? Foi então que os colegas entraram em campo. Os homens, é claro! Eles me ajudavam a compor as matérias. Tudo isso sem pisar no Joia da Princesa.
Lembro como hoje que Zadir Porto me ajudou muitas vezes. Trazia as informações completas sobre o jogo da equipe local contra o time da capital ou de outras cidades vizinhas. Tinha o jogo de ida e o jogo de volta, e eu sem entender nada.
No jornal, em Salvador, a editoria de esportes não poupava elogios, longe de saber que as matérias perfeitas, usando convenientemente o jargão esportivo, eram feitas contando, como sempre, com o apoio dos colegas que, solidários, poupavam a minha ida ao estádio.
No país do futebol como o nosso, impensável tanta ignorância sobre o tema. Mas a verdade é que, naquela época, uma mulher no campo de futebol ainda mais como profissional, era uma novidade, principalmente se levarmos em conta que eu era a única a fazer incursões no jornalismo profissional na nossa cidade.
Curiosamente, me sobressaía na cobertura policial, muito mais barra pesada e até então restrita aos homens, mas não conseguia me adaptar à cobertura esportiva. Nem eu mesma entendo.
Hoje, sou flamenguista para seguir o meu filho que é um torcedor apaixonado do Flamengo. Aprendi com ele a tomar gosto pelo time. Afora os jogos do Mengão só assisto a Seleção Brasileira em dias de competições decisivas. Mas estou aprendendo e gostando de futebol. Uma vitória.
Dia desses, assisti na televisão uma longa reportagem em que um grupo de mulheres reivindicava o direito de ir ao estádio em segurança. Muitas delas afirmaram que amam futebol, mas ultimamente evitavam frequentar estádios, com receio de assédio e da violência em campo, sobretudo entre as torcidas. Mas essa é uma outra conversa. Vai ficar para outra oportunidade.
Socorro Pitombo é jornalista
foto: Reginaldo Tracajá/Estádio Jóia da Princesa
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