Estou há exatos 52 dias em casa, afastada de minhas atividades presenciais na UniFTC Feira de Santana e na Câmara Municipal. Uma questão de precaução, já que faço parte do grupo de risco para o invisível e temido Coronavírus. E, ao contrário do que sente a grande maioria das pessoas que vive situação semelhante, não acho isso ruim, pelo contrário. Afinal, agora eu tenho algo que há muitos anos buscava em minha labuta diária: tempo.
E é exatamente a noção de disponibilidade do tempo, mesmo com tarefas profissionais a serem cumpridas, que tem me levado a rever minha postura diante da vida e das pessoas com quem a divido. Há muito tempo ou há alguns poucos anos. Nesse percurso, até a distância ganhou um novo significado. Nunca tantas ideias foram discutidas com tamanha intensidade entre meus colegas de trabalho e superiores. É isso mesmo, a internet aproxima, mesmo de longe.
Nesse novo formato de trabalho, adotado de forma inevitável por conta do distanciamento social imposto pela pandemia, Feira de Santana está tão próxima de Itabuna e Eunápolis, como de Juazeiro, Petrolina, Conquista, Jequié e Salvador. A cada reunião, estamos juntos na tela do computador. Bem mais perto do que antes. Ficamos mais íntimos também. Compartilhamos textos, lives, postagens, fotos, preocupações, da mesma forma que dividimos aflições pessoais.
E não é exagero. Em tempos de isolamento, até a morte chega com nova roupagem. Domingo (4/5), acordei com a notícia de que uma boa e velha amiga havia deixado essa dimensão. Maria Mercês Pimenta tinha 87 anos e durante muito tempo estivemos bem próximas. Não nos últimos anos. Falei com dois de seus filhos e uma nora e remexi meus arquivos em busca de fotos para relembrar momentos que não serão mais vividos. E nesse emaranhado de emoções, nada aplacou a falta do abraço em seus familiares, especialmente Cristina, sua parceira de vida, com quem ainda não tive coragem de falar.
Sentimentos parecidos devem ter sido experimentados pelos familiares e amigos do compositor Aldir Blanc e do ator Flávio Migliaccio, que fizeram a viagem definitiva no mesmo dia. Nunca os vi, a não ser por meio da ressonância de suas respectivas obras. Mas senti a dor dos seus como se fosse minha. Mais uma vez a noção de distância se desfez e, ao ler a carta atribuída ao ator comediante, um vazio enorme tomou conta de mim. Realmente, está muito difícil viver nesse mundo podre, com a humanidade infectada por sentimentos mais devastadores do que um vírus mortal.
A saudade é enorme. De todos e de tudo. O que eu quero mesmo é voltar a viver normalmente, sem essa lança apontada para nossa cabeça, vendo o lindo jardim da UniFTC todos os dias. Mas sei que por enquanto e, ao que tudo indica, por muito tempo ainda, isso não será possível. Continuarei vendo meus netos, minha filha e demais pessoas queridas por vídeo chamadas, aproveitando o tempo que estou em casa para cuidar do lugar onde vivo, fazendo do whatsapp um elo com meus amigos e colegas de trabalho. No mais, vou guardar todos os abraços e a saudade.