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O Coletivo UEFS de Todos divulgou hoje (18) um artigo crítico às ações da atual Reitoria no contexto da pandemia da Covid-19. O grupo denuncia a “incapacidade da reitoria de pensar um processo acadêmico durante a pandemia” e chama a atenção para a necessidade de manter em vista “o espaço de inclusão em que as universidades públicas se tornaram com as políticas de Ações Afirmativas”.
Na última quinta-feira (14), o coletivo também havia divulgado uma breve nota em sua página do Facebook criticando a proposta da Reitoria de retomada das atividades em regime de Educação a Distância (EaD) e acusando a gestão de alinhamento “à política do Ministro da Educação do governo Bolsonaro, Abraham Weintraub, que quer aulas a qualquer custo”.
Confira o artigo na íntegra:
UEFS de TODOS: A INCAPACIDADE DA REITORIA DA UEFS DE PENSAR UM PROCESSO ACADÊMICO DURANTE A PANDEMIA
Estamos passando por um período atípico, no qual a vida em comunidade, em grande parte, tem se restringido às redes sociais. Essa tem sido a nova janela para ver o mundo. As reuniões presenciais, os encontros físicos, as chamadas “aglomerações” de pessoas deixaram de fazer parte do nosso cotidiano. Essa mudança de comportamento se deu em virtude da pandemia do novo coronavírus (COVID-19): o Brasil e o mundo pararam, todos pararam. As escolas e as universidades tiveram as suas atividades presenciais suspensas. Afinal, como manter estudantes em salas de aulas com um vírus que nos circunda e habita no ar que respiramos?
No mundo, o novo coronavírus apareceu no final de 2019, passou pela Europa em janeiro de 2020 e suspeita-se que chegou ao Brasil no final de janeiro, pouco antes do carnaval. Nos lugares pelos quais passou, deixou o seu rastro de morte e obrigou o isolamento das pessoas. País por país, cidade por cidade, foram parando e populações inteiras se isolando em suas casas. Mas, antes de sucumbir ao coronavírus uma pergunta recorrente ecoava: Quando parar? Quanto mais demorada a resposta, maior o número de pessoas contaminadas, maior o número de mortos.
No início da pandemia no Brasil, as universidades estavam em pleno semestre letivo, a UEFS estava no final do semestre e com um pouco mais de tempo poderia terminá-lo. Novamente a pergunta: quando parar? O número de mortes em todos os lugares aumentava e o medo coletivo não cedeu mais espaço para repetir a pergunta ecoando um grito de que era preciso parar. Diversos Diretórios Acadêmicos de Cursos lançaram notas solicitando à Reitoria da UEFS a suspensão das aulas. Alheio às notas dos estudantes, encastelado na Reitoria, o Reitor passou a contar os dias para o final do semestre, desconsiderando os protestos da comunidade. Mesmo diante da suspeita de um estudante da UEFS contaminado com o vírus, a Reitoria continuou empurrando o problema adiante. Afinal, faltava pouco para o final do semestre. Quanto mais demorada a resposta, maior era o número de pessoas contaminadas e de mortos pelo mundo, elevando o pânico na universidade. Um grito imperativo de suspensão das aulas ecoou do governo do estado e a esse grito a Reitoria acatou de imediato, assumindo a sua incapacidade de tomar uma decisão, permitindo que um outro tomasse a decisão que deveria ser sua como gestora da universidade. Enfim, as atividades presenciais da universidade pararam. Não por deliberação da sua comunidade, não porque o Reitor e seu staff ouviram o apelo dos estudantes, não porque o Reitor e o seu staff ouviram as considerações dos funcionários, não porque o Reitor e seu staff ouviram as ponderações dos docentes. Parou porque o Governador determinou.
A pandemia vai passar! No entanto, mesmo quando passar, a vida não terá a mesma normalidade de antes, teremos um “novo normal”. O semestre letivo da UEFS, que a Reitoria não queria parar, acabou (ou talvez não tenha acabado ainda), mesmo durante o isolamento. Foi um final atropelado, cheio de percalços. As atividades foram concluídas com o auxílio de ferramentas digitais de atividades a distância. Estudantes com dificuldades de acesso às atividades, propostas pelos professores, em virtude da precariedade de infraestrutura de internet em suas cidades e residências. Não podemos esquecer que a UEFS possui estudantes trabalhadores/as que, em virtude do isolamento, tiveram suas atividades laborais transferidas para as suas casas, além de estudantes pais e mães que tiveram as creches e as escolas de seus filhos fechadas. Esses sofreram duplamente no encerramento do semestre e alguns talvez não o tenham concluído com êxito. A UEFS precisa aprender com essa nova experiência
Agora a UEFS discute como e de que forma retomar as atividades em sala de aula. Contudo, não nos surpreende a incapacidade da Reitoria da UEFS de pensar um processo acadêmico durante a pandemia. Isso nos entristece. Sua incapacidade é evidenciada na tentativa de apresentar uma proposta de calendário acadêmico extraordinário, sem realizar uma ampla discussão com professores, estudantes e excluindo os servidores técnicos e administrativos do processo. Uma Universidade se faz e existe, com ensino, com extensão e com pesquisa, com estudantes, com servidores técnicos administrativos e com professores. O aligeiramento da Reitoria de aprovar um calendário acadêmico, a todo custo, no contexto atual, pelo qual a sociedade como um todo, e, em particular, os estudantes vêm passando, só se justifica no pensamento limitado de uma gestão que se limita a enxergar a universidade como a executora de um calendário acadêmico e com a “aplicação” de componentes curriculares, de modo alinhado à atual política do MEC (Ministério da Educação do governo federal). Esse aligeiramento, que traduz a limitação de pensamento de uma gestão, sofreu duras críticas inclusive da ADUFS (Associação dos Docentes da UEFS), em nota pública de 15 de maio de 2020. Felizmente a gestão de uma universidade pública não se dá unicamente pelas ações da Reitoria. Em sua construção democrática, a gestão é compartilhada pelos Conselhos Superiores (CONSEPE e CONSU) constituídos pelos Colegiados de Cursos, Departamentos e representantes da comunidade universitária. Deste modo, em reunião do CONSU, sob várias críticas, retirou-se da pauta a proposta da Reitoria, para que possa ser amplamente discutida com estudantes, com servidores técnicos administrativos e com professores. Também, é de extrema importância a participação dos sindicatos (ADUFS e SINTEST) e representações estudantis (DCE, DAs e COLETIVOS) nesse debate em virtude do potencial de precarização das condições de trabalho e da qualidade pedagógica, sem falar do processo de exclusão, embutido na proposta apresentada pela Reitoria.
Como e quando retomar as atividades acadêmicas regulares? Quando a pandemia passar, a vida não terá a mesma normalidade de antes. As universidades e as escolas terão de se reinventar nos seus processos acadêmicos. Alguns paradigmas de ensino e aprendizagem terão que ser transformados e junto com eles preconceitos precisarão ser rompidos. No entanto, não podemos perder de vista o espaço de inclusão em que as universidades públicas se tornaram com as Políticas de Ações Afirmativas. Não podemos esquecer, que, desde 2006, a UEFS possui uma Política de Cotas que a transformou em um espaço de saber socialmente referenciado, possibilitando o acesso à universidade para negros, quilombolas e indígenas, que em sua grande maioria dependem da infraestrutura material, didática e pedagógica fornecida pela universidade para o andamento das suas atividades. Logo, os novos processos pedagógicos não podem prescindir de um amplo debate, da construção de infraestrutura, para além da que dispomos, com o objetivo de atender a essas novas políticas de ensino, contemplando a capacitação de professores, servidores técnicos e estudantes em novas tecnologias e o mais importante, que seja inclusiva, possibilitando o acesso de todos os estudantes nesse processo.
UEFS de TODOS, 18 de maio de 2020.