Como está acontecendo em todos os segmentos, o mercado da moda também está sofrendo muito com a pandemia e suas consequências. Setor forte na nossa economia – representa 17% dos empregos no país -, o mercado da moda tem sido afetado intensamente, seja no âmbito produtivo, no setor de distribuição e, sobretudo, na dinâmica de consumo.
No distanciamento social que ainda estamos vivendo, há uma certa mudança do comportamento de consumo. As pessoas não necessitam de uma maior produção da aparência, e, consequentemente, estão reduzindo a busca por novas peças de vestuário e acessórios.
Assim, também a modelagem corporal tem sido transformada. Podemos observar a reinvenção da aparência, a partir de vários fatores: dificuldade para pintar os cabelos brancos o que tem feito muitas mulheres a assumir o look white; o descuido no peso que pode provocar o aparecimento de uma silhueta mais larga, inclusive incidindo nas modelagens das peças.
Além desses fatores, uma nova moldura para o rosto, que agora aparece com esse novo artefato utilitário que é a máscara, mas que certamente não se desvencilha totalmente do glamour e da fantasia (e isso é bom que aconteça!).
A maquiagem e a beleza específica dos olhos ganham maior atenção, não apenas por conta do quadro da tela, tendo em vista que, com a pandemia, a internet se consolidou como uma das mais importantes ferramentas para discussão e debates de temas importantes; como em função do uso das máscaras. Quem diria que um dia as nossas faces seriam representadas apenas pelos olhos? Há quem diga que esse artefato, como um uniforme facial, unificou as pessoas, mas há também quem discorde, sob o argumento de que o distinguir-se é próprio do ser humano. Daí as peças de tamanhos, modelos e materiais diferentes, lisas, floridas, estampadas, divertidas e bordadas, atendendo ao gosto de cada um. Eu por exemplo, jamais usaria uma máscara de cor vermelha. Não combina nem um pouco comigo. Prefiro cores mais clássicas, como o preto, o branco e o nude, que considero mais discretas e elegantes.
Desse modo, vamos observar como as máscaras revelam a personalidade de cada um, a maneira de ser e estar no mundo. Aos poucos fui percebendo também a importância de uma maior produção da aparência para participar das lives e outras manifestações pela internet. É preciso cuidar dos cabelos, da maquiagem, e dos adornos do tronco para aparecer bem na tela, já que a nossa imagem vai ser vista por muitas pessoas.
Há de se considerar, portanto, uma intensificação nas performances corporais, auxiliadas pelo revestimento vestimentar e dos adornos que vão compor essa imagem de si. Uma preocupação mais direcionada com a parte superior do tronco e, sobretudo, da face se potencializa. Roupas confortáveis e looks que privilegiam a parte de cima da silhueta, sobretudo colo e ombros (pensando nessa valorização do rosto e tronco nas telas; bijuterias volumosas e muitas já aplicadas nas peças).
Adereços para o pescoço, orelhas e cabelos; blusas com cortes, cores e texturas que favoreçam a moldura da imagem corporal a ser vista são enfatizadas; casacos aconchegantes, simulando materiais e aparência das roupas de cama, dos edredons, como os acolchoados… e ternos tipo pijama, em tecidos de seda, extremamente confortáveis e elegantes.
Decerto, essa reiteração e proliferação da imagem de si e dos outros, celebra o enigma da aparição e da visibilidade.
Texto produzido em parceria com Renata Pitombo Cidreira, jornalista, doutora em Comunicação e Cultura Contemporâneas pela UFBA, com pós-doutorado em Sociologia pela Université Paris V-Sorbonne. Professora da UFRB e pesquisadora de Moda. Autora dos livros Os Sentidos da Moda (Annablume, 2005), A Sagração da Aparência (EDUFBA, 2011), A Moda Numa Perspectiva Compreensiva (Editora UFRB, 2014), entre outros.
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