O sanfoneiro Francisco de Sena, o Bié dos 8 Baixos, tinha lá suas vaidades além da elegância que cultivava no vestir e usar, roupas coloridas, chapéus de abas largas, cordões, pulseiras, as mãos esparramadas de anéis brilhantes adornando os dedos ágeis deslizando na sanfona.
Digo, nas sanfonas. Mais de uma. Ele tinha orgulho das ‘8 Baixos’ que possuía, como exemplo de profissional precavido, pronto para superar imprevistos e animar qualquer festa. “Eu tenho mais duas dessa lá em casa…é…!” , ele me disse uma vez, soltando aquelas risadas que estão imortalizadas nos excelentes registros documentais, artísticos, feitos por Uyatã Raira.
Na primeira vez que vi Bié a primeira imagem que me veio foi a do cantador de viola Zé Limeira, que não conheci e nem há dele uma fotografia, mas está descrito de maneira límpida e fenomenal no livro do poeta e jornalista Orlando Tejo. Nesse dia havia até o lenço vermelho amarrado no pescoço, à moda de gravata solene, como usavam os cangaceiros pelas caatingas. Na lírica de Tejo, Zé Limeira, o poeta do absurdo, andava à pé o território paraibano. Bié descia do bairro George Américo para o Centro de Abastecimento, nas segundas-feiras, montado numa bicicleta tão tropicalista quanto ele, das antigas, enfeitados guidom, selim, rodas e coroando a garupa alcochoada estava a sanfona escolhida para o “Samba de Bié” logo mais na barraca de Santinha, no meio da feira.
Numa segunda-feira eu estava lá quando Baio (André Galdino) chegou e tocou na sanfona vermelha que Bié lhe cedeu reverente e bateu mão no pandeiro acompanhando no ritmo e improvisação o bamba do acordeon. Baio e Bié, um show naquela segunda-feira.
Bié morreu e ficou a família com as sanfonas. Uma está exposta à venda. Se lhe interessar posso dizer o número do zap do filho dele, o Bita (75 8362-7417 ) e que você adquire um objeto com dois valores ou com valor duplo: o dele em si, instrumento bom, bem zelado, com afinação, etc, e o valor que ele representa para a cultura popular da Feira de Santana.
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