As Áreas Protegidas (AP) são os pilares para a conservação da biodiversidade — entre elas, estão as Terras Indígenas (TI) e as Unidades de Conservação (UC). São espaços geograficamente definidos, regulamentados e gerenciados. Nas duas últimas décadas, as APs foram criadas não apenas para conservar e fornecer habitat para a fauna e flora ameaçada, mas para assegurar a existência dos a garantia da segurança alimentar, a oferta de turismo, a proteção de culturas, o armazenamento de carbono e a mitigação e adaptação às mudanças climáticas.
Na Bahia existem 23 áreas declaradas como TI, das quais 15 já estão regulamentadas. A maior concentração das TI está nas regiões Sul (MA), Nordeste, entre os vales do São Francisco e Vaza-Barris (CA) e Oeste (CE) do estado. Essas áreas são importantes para a mitigação das mudanças climáticas, já que apresentam baixas taxas de desmatamento ilegal. O estado tem, ainda, 115 UC — 39 delas são municipais, 45 estaduais e 31 federais, sendo que 54% estão na categoria de Uso Sustentável e 46% são classificadas como Proteção Integral.
As maiores concentrações de UC estão no bioma da MA, que atinge toda a extensão do litoral, além de uma pequena área localizada no Recôncavo Baiano. No domínio da CA, observam-se importantes UC, como o Parque Nacional da Chapada Diamantina, Serra do Barbado e Nascentes do Rio de Contas, onde há regiões com altitudes elevadas (800 a 2.033 m) e predomínio dos campos rupestres — uma vegetação típica da Cadeia do Espinhaço e com altos índices de endemismos. Ao norte e noroeste do Estado, ainda sob influência da CA, destacam-se as UC das regiões do Raso da Catarina e de Juazeiro, onde há um programa para a reintrodução da ararinha-azul (Anodorhynchus leari) na natureza. Às margens do rio São Francisco, no município de Sento Sé, localiza-se o Parque Nacional do Boqueirão da Onça, que apresenta a maior população de onças-pintadas (Panthera onca) da CA, além de outras espécies ameaçadas como o tatu-bola (Tolypeutes tricinctus). O local também abriga a maior concentração de sítios arqueológicos do Brasil. Na região oeste do estado, destacam-se a Estação Ecológica Preto, o Parque Nacional Grande Sertão Veredas e o Refúgio de Vida Silvestre das Veredas do Oeste Baiano, sendo as duas últimas criadas para proteger a excepcional biodiversidade e os recursos hídricos das veredas, ecossistema único do CE e um dos responsáveis pelo abastecimento da bacia do rio São Francisco.
Estudos sobre a biodiversidade em UC na Bahia ainda são escassos. Quando realizados, os inventários de flora, algas ou fungos se concentram, em grande parte, em famílias específicas de uma determinada área, principalmente nas regiões do Parque Nacional da Chapada Diamantina (sob o domínio da CA) e na Reserva Biológica de Una (MA).
Para os ambientes marinhos, as macroalgas têm sido sistematicamente estudadas ao longo do litoral baiano, com especial atenção para a Área de Proteção Ambiental (APA) do Litoral Norte. Nos levantamentos sobre a fauna em UC, destacam-se inventários realizados com a herpetofauna, insetos (lepidópteras e himenópteras), mamíferos e peixes, entre outros. Um estudo realizado com a fauna ameaçada de extinção em UC federais revelou que a Bahia é o estado com os maiores números de registros (170) e de espécies ameaçadas (81) do Brasil.
Pelo exposto, observa-se que as APs na Bahia estão mais concentradas em áreas de MA, sendo que a maioria se encontra no litoral. Domínios da CA e do CE, em contrapartida, estão negligenciados em relação à quantidade de áreas protegidas. Um mapeamento realizado pelaWWF-Brasil e pela Secretaria de Meio Ambiente do Estado da Bahia (Sema-BA) revelou que, entre as 336 áreas prioritárias para conservação da biodiversidade em ambiente terrestre e marinho, 48 precisam de ações urgentes de conservação e/ou recuperação. Entre as ações recomendadas pelo estudo estão a criação ou ampliação de UC (57 áreas) e inventários biológicos (245 áreas).
A partir do mapeamento realizado peloWWF-Sema (2013-2015), é conveniente selecionar as áreas prioritárias para ações imediatas, focando principalmente nos ambientes marinhos, espaços onde o número de áreas protegidas atinge valores mínimos. Com relação ao continente, é sugerida a ampliação de UC em áreas de MA, além da região costeira, como as localidades de Ubaíra, Iguaí, Itamaraju, Itapetinga, Eunápolis e Recôncavo Baiano. No que tange às regiões situadas no bioma CA, é interessante expandir as áreas de UC para a região de Senhor do Bonfim, Campo Formoso e Jacobina, onde está situada a Serra do Tombador — borda oriental da Chapada Diamantina.
Trata-se de um território com grande potencial de fauna e flora endêmicas. Além dessas áreas, a região de Seabra é citada como altamente prioritária para conservação, assim como a região de Caetité, muito próxima a localidades onde foram identificados novos gêneros, espécies e um elevado endemismo para diversos grupos de angiospermas. Na região oeste da Bahia, os entornos dos municípios de Barreiras e Santa Maria da Vitória podem ser exemplos de lacunas em áreas protegidas.
Criar ou expandir UC no estado, no entanto, não é suficiente. É preciso investir no gerenciamento e funcionamento atualmente precários desses espaços, o que pode ser feito por meio do aumento de recursos providos por agências ambientais ou de fomento à pesquisa. Além disso, a predominância de Áreas de Proteção Ambiental (APA) em detrimento às UC de Proteção Integral deve ser revista, considerando o elevado impacto causado pelas atividades hoje permitidas.
Em relação às linhas de pesquisa e à geração de recursos humanos existentes na Bahia, recomenda-se o investimento na formação de taxonomistas — os únicos profissionais capazes de descrever e nomear a biodiversidade. É, também, necessário investir em pesquisas ecológicas que abordem os SE, e em estudos com populações tradicionais e não tradicionais no interior e no entorno das UCs.
FOTO. Parque Nacional da Chapada Diamantina.
*Trecho de um artigo acadêmico, com o mesmo título, publicado no site da Academia de Ciências da Bahia( clique aqui)e de autoria dos seguintes pesquisadores:
Alexandre Clistenes de Alcântara Santos, Professor Pleno da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).
Alexandre Schiavetti, Professor Pleno da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e Membro da Academia de Ciências da Bahia(ACB).
Blandina Felipe Viana Professora Titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Deborah Faria Professora Plena da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC).
Lídia Campos Pesquisadora Independente associada ao Laboratório Flora (UFBA).
Nadia Roque Professora Titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
Carlos Alfredo Lopes de Carvalho Professor Titular da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB) e Membro da Academia de Ciências
da Bahia (ACB).