Desembarcou na Estação Rodoviária no fim da manhã. Desviou dos passageiros, das malas e valises, das caixas, dos carregadores, dos fiscais, motoristas e cobradores e saiu pelo portão lateral do desembarque. O sol acolheu-o na rampa que conduz à saída. Refugou as corridas de táxis, contornou uma poça fétida de lama, aventurou-se entre os automóveis, as motos, as bicicletas, os pedestres, um caminhão enorme em manobras estrepitosas e galgou, com satisfação, a calçada que delimita hoteis baratos e restaurantes populares ali na Comandante Almiro.
Suspirou curto, aliviado, têmporas latejando.
O suor despontava na testa. Luzidia, a calva refletia a luz cariciosa do sol de inverno.
Aproveitou para examinar os incontáveis e multicoloridos paineis das lojas próximas prometendo, com letreiros chamativos, os preços mais baixos e os produtos mais incríveis. Em volta, aquela agonia de gente, os pedestres correndo para os ônibus, os trabalhadores correndo atrás do real, os consumidores correndo atrás das melhores ofertas e os desocupados correndo atrás de qualquer ocupação.
No semáforo da Avenida Sampaio aquela disputa renhida, agressiva, gratuita, incessante, motores e buzinas requisitando atenção, desabafando, desacatando. Era a sinfonia dos egos inflamados, doloridos pela desatenção, magoados pelas indiferença. Ali, o burguês bem-vestido, postura de senhor respeitável, na gabine elegante da caminhonete possante. O motoqueiro ansioso, autônomo, descapitalizado, do lado. A trinca de tabaroas, roceiras e ronceiras, pejadas de sacolas, pés aflitos sobre a faixa deflorada de pedestres.
Silêncio curto ali na Leonídio Rocha. Passantes escassos, mergulhando nos corredores dos prédios, nas salas dos escritórios comerciais. Pios de pardais, o céu enfeitando-se de azul acima das fachadas dos prédios. Depois os automóveis começaram a despontar, tangendo aquele arremedo de bucolismo.
Na Getúlio Vargas o vagalhão de paineis se ampliou, apelativo, onipresente, sufocante, quase desesperador. Pedestres apressados, bancando metrópole nas feições indiferentes, no passo agoniado. O trânsito lento também bancava metrópole. A balbúrdia e a bagunça dos motoristas, porém, resgatavam o provincianismo o tempo todo. Sol preguiçoso sobre a copa das árvores, que farfalhavam com suavidade, reluzentes.
Achegava-se às cercanias do Paço Municipal, da Igreja Senhor dos Passos. O clima de centro da cidade se intensificava, sentia-o no ar. Passantes, muitos passantes. Passageiros também, muitos passageiros. Conversavam, compravam, panfletavam, comiam, negociavam, bebiam, apregoavam, sorriam, crispavam-se. Manhã de segunda-feira, a metrópole sertaneja fervilhando.
Deparou-se, então, com o Mercado de Arte Popular. Entrou, sentou à mesa, requisitou a primeira cerveja, farejou no ar o cheiro de maniçoba. Depois examinou, com vagar, as colunas toscanas intocadas, o teto metálico que já fora telhado de duas e quatro águas, as fachadas envolvidas em arcos que dão acesso aos boxes e sentiu uma imensa, uma profunda satisfação por estar ali. Sorveu o primeiro gole com sofreguidão e, de imediato, uma onda de prazer percorreu vagarosamente o seu corpo…
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