Falta pouco menos de um ano para as eleições municipais. Na Feira de Santana, porém, a sucessão começa a virar assunto obrigatório em qualquer roda de conversa. Após as santas celebrações religiosas, nos pecaminosos botequins da cidade, nas esquinas, feiras-livres, terminais de ônibus, mas – sobretudo – nos aplicativos de conversa os papos rolam soltos. As zangas também.
Nesses tempos de altas divergências e disposições beligerantes, antigas amizades começam a estremecer. Diverge-se sobre tudo: quem leva a prefeitura; quem se elege vereador; quem sai candidato ou não; enfim, tudo implica em polêmica. Debate-se, inclusive, a força de apoiadores estaduais e nacionais, o potencial de transferência de voto e por aí vai.
Uma divergência, porém, já devia estar pacificada. É o peso atribuído a presidentes e governadores como cabos eleitorais. Os resultados de 12 eleições realizadas desde 2000 mostram que não há transferência automática de votos, nem impacto significativo. Ou seja, os sufrágios em prefeitos costumam apresentar preferência partidária distinta daqueles destinados a presidentes e governadores.
Os números seguintes, todos extraídos do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), atestam o raciocínio.
Como todo sabem, neste século XXI José Ronaldo de Carvalho (UB) notabiliza-se como o grande protagonista das eleições municipais na Feira de Santana. Venceu quatro delas, com ampla margem: em 2000, cravou 126.230 votos e percentual de 61,44%; quatro anos depois, se reelegeu com votação ainda mais expressiva – 170.162 – e percentual mais folgado (68,5%).
A terceira eleição veio em 2012 – percentual de 66,04% e 195.967 votos – e a segunda reeleição marcou seu ápice, em 2016, quando alcançou notáveis 212.408 votos e 71,12% de preferência do eleitorado. De quebra, elegeu dois sucessores: Tarcízio Pimenta em 2008 (148.448 votos e 54,05%) e Colbert Martins em 2020 (164.831 votos e 54,42%).
Fenômeno eleitoral comparável a José Ronaldo em Feira de Santana só o presidente Lula (PT). Os números apresentados na sequência referem-se sempre ao segundo turno. No remoto 2002, Lula alcançou a presidência cravando 157.090 votos na Feira, o equivalente a 71,78% de preferência; quatro anos depois, a reeleição foi ainda mais fácil: 202.515 e percentual de 77,76%. Na sequência, Dilma Rousseff (PT) elegeu-se e reelegeu-se com folgada dianteira por aqui. Em 2010 foram 158.577 votos (59,26%) e em 2014 mais 197.054 (66,71%). Sempre com o apoio de Lula, diga-se.
Mesmo na maré vazante do PT o lulismo seguiu hegemônico na Feira de Santana. Em 2018, no segundo turno, Fernando Haddad (PT) garantiu 194.826 votos (62,85%) e, ano passado, o próprio Lula elegeu-se pela terceira vez com nada menos que 221.406 votos, o que correspondeu a 64,03% do percentual de votantes feirenses.
Foram, portanto, seis eleições municipais e outras seis para a presidência da República desde 2000. Nelas, José Ronaldo e Lula – políticos de distintas orientações ideológicas – foram os grandes e, praticamente, únicos vencedores. Cada um em sua esfera federativa.
Nas esquinas, contesta-se o desempenho de ambos como cabos eleitorais. José Ronaldo carrearia poucos votos em níveis estadual e federal; e Lula, por sua vez, jamais conseguiu eleger um petista – ou até um político alinhado – para a prefeitura feirense. Pode-se deduzir que o raciocínio é equivocado quando se considera que, na cabeça do eleitor, os pleitos são independentes.
Tudo indica que o eleitorado não enxerga, necessariamente, vínculo entre as eleições municipais e as estaduais/federais. Daí movimente-se com mais desenvoltura, escolhendo candidatos até antagônicos em termos partidários. O fenômeno, aliás, não é exclusividade feirense e repete-se Bahia – e Brasil – afora. Nacionalizada, por suas características de megalópole, só a prefeitura de São Paulo.
Obviamente, cada eleição tem sua própria história, embora aqui na Feira de Santana exista um padrão que vem se perpetuando ao longo do século, mesmo de maneira não homogênea. Colbert Martins, por exemplo, foi derrotado no primeiro turno da eleição passada e conseguiu a virada no segundo turno, enfrentando Zé Neto (PT). Aquela derrota, revertida posteriormente, foi o primeiro revés enfrentado pelo grupo político do ex-prefeito José Ronaldo.
Levantamentos recentes sinalizam para um novo embate entre José Ronaldo e Zé Neto pela prefeitura feirense. Correndo por fora, como novidade, Pablo Roberto (PSDB), que anunciou candidatura e que garante que não recua.
Ano que vem mais um capítulo da história das eleições no século XXI no município será escrito. Haverá novidades? Isso só o eleitorado feirense poderá revelar.
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