Chovia a cântaros no estertor do dia (epa! roubando dos poetas) batidas repetidas na casa de Oswaldo Torres, recostado na poltrona, luzes apagadas, nada de rádio ligado, espelhos cobertos, todas as medidas de cautela contra raios, como se apregoava antigamente e até hoje com pessoas crentes. As crianças e os serviçais já dormindo. Oswaldo demorou um tempo para reconhecer que eram batidas na porta da rua, diferenciando do ribombar dos trovões. Entra a porta está aberta, exclamou Oswaldo – neste tempo só se fechava a porta quando todos estivessem dormindo – acendeu a luz e para seu espanto apareceu Zé Coió, sua esposa Maria e uma renca de filhos. Vimos morar aqui, disse José Carlos Pedreira, respeitado jornalista, dono e editor do jornal/revista “Feira Noite&Dia”, meu amigo desde criança, mais conhecido como Zé Coió, apelido ganho pela irreverência de humor inteligente de um famoso cômico que se apresentava na “Festa da Mocidade”, grandioso parque de diversões com teatro, anualmente fazia temporada em Salvador na década de cinquenta. Hoje ZÉ COIÓ não é mais um apelido e sim uma marca.
Para entender o inusitado, necessário voltar o que fez Coió ter essa atitude:
Oswaldo construiu algumas casas para alugar, em uma travessa da Maria Quitéria nas imediações do clube BNB. Uma dessas residência foi alugada a Coió. Tudo bem até quando as chuvas de verão comuns nos trópicos atingiram a região criando verdadeiros problemas.
Zé Coió achou que a responsabilidad era do senhorio, Oswaldo Torres e ele deveria dar guarida até quando tivesse condições de moradia para ele retornar à residência alugada.
Conto essa história para identificação do responsável pela dificuldade causada por intempéries.
A mídia mundial entrevistando sobreviventes e socorristas nestes episódios, vemos diferenças de entendimento, nos terremotos, nos tufões, nas grandes chuvas. Normalmente não há busca de culpados, quando muito, questões ecológicas.
Sempre se soube que o Brasil era aquinhoado pela sorte no que tange catástrofes naturais existentes pelo mundo afora: tufões, terremotos, maremotos, ciclones. Mas temos chuvas torrenciais, característica de regiões tropicais, chuvas sempre bem vindas para o campo no semiárido, mas provocam inúmeros desastres, principalmente para os mais pobres. A seguir algumas intempéries registradas pela imprensa feirense:
03/01/1885 – Chuva de pedras na freguesia Gameleira.
Vidas Feirenses Folha do Norte 08.01.1938
1910 e 1990 Neve em Feira de Santana
Neve não chegou a cair, mas gelo sim.
O granizo, fenômeno atmosférico raro no semiárido brasileiro, causou espanto e alguns prejuízos para os feirenses citadinos no ano de 1910 e mais recentemente de 1990.
Feira Relíquias 03/01/1990
01/01/1903 – Assenta-se a primeira pedra da capelinha do alto do Gonçalo, servindo de paraninfos o coronel José Freire de Lima, intendente municipal, e o advogado Miguel Ribeiro de Oliveira, deputado estadual Toca a ph. “25 de Março”. Em pleno decorrer do ato desabam chuvas torrenciais.
7/1/1933 -Chuvas no sertão bahiano
Chega-nos a boa nova de haver chovido em várias zona de nosso sertão, levando esperanças fagueiras a criadores, lavradores e aos flagelados em geral.
Desabaram pesadas chuvas nos municípios de Mundo Novo, Baixa Grande, Monte Alegre, Capivary e Morro do Chapéu.
Também choveu em sítio novo e Machado Portella.
Foram pouco copiosas as chuvas na zona de Lavras, Lençóes e Andarahy.
Também foram aquinhoados com chuvas regulares os municípios de Ituassú, Livramento, Minas de Rio de Contas, Macahubas, Caitité, Guanamby, Monte Alto e outros do Alto Sertão.
Folha do Norte.
Com cerca de oito décadas de testemunhos de grandes chuvas assistidas na região, não lembro em Feira de Santana de eventos catastróficos que tivesse vítimas fatais como vemos, ouvimos e lemos no Brasil. Quando no governo de Colbert Martins, pai do prefeito atual, fez uma macro drenagem na Praça Jakson Amaury e o Governador João Durval uma colossal obra de drenagem com recurso estadual, nas imediações do Horto Florestal, estas grandes intervenções, quando da construção havia dezenas de queixas, sobre tráfego e prédios das imediações, depois de pronto fica escondido em baixo da terra e ninguém se lembra do benefício.
Mas vejo muita indignação justa dos mais pobres que sofrem com perdas materiais. Aí vem uma enxurrada – termo adequado para o assunto – de busca de culpados: Governo, Câmara, falta de educação dos munícipes com descartes de lixo inadequados entupindo os esgotos, problemas ecológicos provocados pelo ser humano, até religiosos fundamentalista, preconizando o fim do mundo, pelos pecados desregrados perpetrados como castigo de Deus.
Evandro Oliveira é um intelectual feirense, especializado em Educação. Dirigiu o Colégio Santanópolis. Pecuarista, historiador, é uma das maiores reservas culturais da Bahia.