“Quero assistir ao sol nascer/Ver as águas dos rios correr/ Ouvir os pássaros cantar/Eu quero nascer, quero viver”
(Preciso me encontrar, de Candeia)
Meninos, eu vi, como diria o velho timbira do poema Y-Juca Pirama, obra prima de Gonçalves Dias. Melhor dizendo: Meninos, eu vivi! Durante dez dias eu vivi intensamente uma experiência que hoje é negada aos habitantes da capital da Bahia, mesmo quando recorrem a todos os santos e orixás em busca de proteção.
Durante dez dias andei livremente pelas ruas sem carregar comigo aquela sensação de insegurança que tomou conta das mentes e corações de todos os que moram em Salvador e em muitas outras cidades baianas.
Andei por avenidas iluminadas, caminhei por ruas de pouca iluminação, descansei em bancos de praças, sem qualquer tipo de receio, nem mesmo o de me perder no labirinto de becos e ruelas da parte velha da cidade – sabia que caso isso acontecesse poderia pedir orientações a qualquer um dos gentis e prestativos habitantes locais.
Em todos esses momentos, fosse dia ou noite, pude tirar o telefone do bolso e fotografar o que quisesse, sem medo de que alguém o arrebatasse de mim ou viesse a me ferir na tentativa de levá-lo.
Ah, como é boa essa sensação de paz, tranquilidade e segurança. Confesso que quase havia esquecido como isso é bom para a alma, para nossa vida.
Não, meu amável, mas incrédulo leitor, não andei por uma dessas pequeninas cidades do interior da Dinamarca ou da Islândia de criminalidade praticamente zero. Nem andei, minha gentil, mas descrente leitora, pelas cidades de uma dessas republiquetas com um meganha fortemente armado em cada esquina.
Passei em Cuba uma temporada de 10 dias, a maioria deles em Havana, uma tranquila metrópole com 2,4 milhões de habitantes, capital de um pais visitado anualmente por milhões de turistas provenientes de todas as partes do mundo – inclusive dos Estados Unidos, a poderosa superpotência que mantém um condenável e absurdo bloqueio econômico a Cuba.
Não, meu caro leitor, ao contrário do que diz a propaganda anticubana, Havana não é uma cidade tremendamente policiada, com um agente policial em cada esquina. Nos dias em que lá estive vi apenas uma dúzia de policiais no máximo – e nenhum deles com algo que se assemelhasse àquele aparato bélico exibido pela PM nos quatro cantos de Salvador.
Deixo a tranquilidade de Havana e retorno a Salvador para saber que o projeto de lei que institui o Bahia Pela Paz, anunciado como um novo programa de segurança do governo estadual (na verdade, é apenas a volta do Pacto Pela Vida, criado no governo de Jaques Wagner e abandonado na gestão de Rui Costa), sequer foi posto em votação na Assembleia Legislativa, onde fora entregue pessoalmente pelo governador Jerônimo Rodrigues há quase dois meses, no dia 13 de março passado.
A ida do governador para entregar pessoalmente projetos de lei à Assembleia Legislativa é uma novidade criada pela atual gestão. Não lembro de outro governador proceder assim. Não resulta em muita coisa, como se vê, mas gera uma foto para postar nas redes sociais.
Tal atraso na votação do projeto de lei só comprova que a segurança – a falta de segurança, melhor dizendo – não é uma questão prioritária para o atual governo da Bahia, assim como não o foi para o anterior, como atestam o elevado número de mortes violentas registrado nos últimos anos e a crescente taxa de letalidade policial, a maior entre os estados brasileiros.
Ah, e não me mandem pra Cuba. Meu lugar é na Bahia, como cantava Riachão. E que “Cuba seja aqui”, como canta Caetano.
José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador