Vocês vejam como são as coisas: curioso que sou, meses atrás comprei esse livro da Patti Smith só pra ver como ele é, ler e vender. Sim, a sinopse deixa claro que trata-se de uma reunião de posts do perfil da cantora e escritora no Instagram, um para cada dia do ano, mas uma coisa é saber, outra coisa é ver, pegar, ler. E era isso que eu queria fazer – e, depois, vender.
Pois antes mesmo de terminar a leitura, coloquei-o à venda. Faltavam apenas dois capítulos, referentes a novembro e dezembro, os quais poderiam ser lidos rapidamente, em poucos minutos, caso aparecesse um comprador. E então apareceu um comprador. E então fui ler os posts dos últimos dois meses. E aí balancei. Não apenas porque Patti dedicou uma postagem/página a Rosa Parks, a heroína que com um ato de rebeldia e coragem desencadeou a luta pelos direitos civis dos negros nos EUA, mas também por outras menções honrosas e importantes (apesar de que agora me pergunto se eu teria balançado caso não houvesse essa menção à Rosa).
Pensei, pensei, folheei, cheirei, tateei. O material da capa de “Um livros dos dias” é gostoso de pegar, tem alguma coisa de papel kraft. O cheiro de “Um livro dos dias” mistura o já conhecido cheiro do papel pólen com o da tinta colorida que aparece em algumas das fotos impressas. Voltando à capa, ela é elegante, verde musgo, com a fonte dourada, um projeto gráfico digno dos maiores elogios. E, bem, tem o conteúdo, que de forma alguma é de se jogar fora. Muito pelo contrário. Patti cita William Blake no dia 24 de novembro e me faz lembrar da vontade que tenho de ler não só Blake, mas Yeats, Coleridge e outros. No dia 9 de dezembro, ela traz versos de uma ária de Puccini que me deixam pensativo (e curioso pela ária e por Puccini): “Tenho vivido pela arte, pelo amor”, versos que definem a minha vida.
Penso, penso, penso.
E concluo: não, não dá. A pessoa que fez o pedido vai ter que me perdoar. Ela poderá comprar o livro de outra forma. Um pouquinho mais caro, é verdade, mas a diferença não é tão grande. “Um livro dos dias” fica. Não era esse o plano, mas, ora, as coisas mudam, não é mesmo?
Rafael Rodrigues é escritor