Dona Pomba, Helena do Bode, Jorge de Angélica, Mamãe Socorro, escolas de samba e futebol feminino. Falar do bairro que reúne tantos personagens e acontecimentos é mergulhar em seu rico protagonismo. Rua Nova é um convite para quem visita a região noroeste da Cidade Princesa.
DONA POMBA – O bairro, que emergiu com a rápida emancipação de seu povo, tornou-se um símbolo das artes, impulsionando a música, o futebol e o artesanato, graças à memorável figura de Dona Pomba (Ernestina Carneiro Ferreira da Silva). Dissertar sobre Rua Nova é falar de um mundo próprio dentro de outro, ou de uma cidade no íntimo de outra. Localizado na parte noroeste de Feira de Santana, o bairro se desenvolveu a partir da “Fazenda de Dona Pomba”, como era originalmente conhecida.
Quem conheceu Ernestina Carneiro, falecida em 1972, só tem elogios a fazer. “Dona Pomba era uma senhora de pele escura, magra, muito educada e atenciosa. Ajudava a quem necessitava e merece todas as homenagens possíveis”, garante Nilton Rasta (Nilton Portela), músico e artesão nascido no bairro, que conhece bem a história daquela localidade.
Na década de 1950, com a expansão da cidade, a fazenda rapidamente se transformou em uma comunidade numerosa, sendo vista como uma nova rua — daí o nome Rua Nova. Algumas pessoas adquiriram lotes que Dona Pomba cedia mediante aforamento, através de recibo, enquanto outras ocuparam espaços concedidos gratuitamente. Após seu falecimento, herdeiros tentaram reaver as terras na Justiça, mas ainda existem questões pendentes.
O que se sabe é que, a partir da instalação da rede de abastecimento de água e do fornecimento de energia elétrica na década de 1960, a expansão demográfica acelerou, tornando a Rua Nova um dos bairros mais populosos da cidade. Atualmente, conta com 25 ruas pavimentadas, escolas, comércio forte, feira-livre, posto de saúde, base da Polícia Militar, que realiza um excelente trabalho de integração com a comunidade, linha de transporte coletivo e tudo o que caracteriza uma comunidade com vida própria.
MAMÃE SOCORRO – O ruanovense, como pode ser chamado, apesar de feirense, é um povo de características únicas, talvez inspirado pela coragem e bondade de Dona Pomba. A musicalidade é marcante, e durante a Micareta, a famosa escola de samba “Escravos do Oriente”, de Mamãe Socorro, animava a avenida, conquistando o título em várias edições do concurso promovido pela Prefeitura.
Com essa motivação, surgiram outras escolas de samba, como a Unidos de Padre Ovídio e Império Feirense, lideradas por Val Porrete e Paulo Brasil, respectivamente. Também surgiram cordões e batucadas, antecedendo a era dos afoxés, como Filhos da África, Zimbabuê e o Pomba de Malê, este último uma homenagem a Dona Pomba, criado por Nilton Rasta, que já se prepara para a Micareta de 2025.
JORGE DE ANGÉLICA – O reggae também encontrou seu espaço no bairro através de Jorge de Angélica, nascido na Kalilândia. Ao chegar à Rua Nova, ele se tornou um grande inspirador do ritmo jamaicano, cantando e compondo sucessos como “Sopa de Papelão”, “Cobra Coral”, “Gari” e “Bahia Negra”. Além disso, com o projeto Mão Angelical, desenvolveu ações sociais em benefício da juventude local, oferecendo cursos de arte, música e dança. Ele também criou a Banda Gana de reggae, pioneira nesse estilo. Jorge faleceu em 30 de outubro de 2023, e o prefeito Colbert Martins decretou três dias de luto.
Jorge de Angélica foi fundamental para o título de “Cidade do Reggae” dado à Rua Nova e ajudou a internacionalizar artistas como Dionorina (Tonho de Onorina), além de dar asas a Nilton Rasta, Libu do Reggae, Beto Maravilha, João Gueto e outros. O bairro também é lar do percussionista Zé das Congas.
No futebol, Paulo Brasileiro foi um grande impulsionador do campeonato no campo Beira Riacho (hoje um estádio) até a chegada de Edmilson Amorim, o Michelinho, que veio de Muritiba e levou o Flamengo a um patamar elevado no futebol local, especialmente com a equipe feminina, tricampeã baiana e representante do estado em competições nacionais. O Flamengo revelou cinco atletas para a seleção brasileira, entre elas a canhota Sissi, atualmente radicada nos Estados Unidos e considerada por muitos a melhor jogadora do Brasil de todos os tempos, superando até mesmo a famosa Marta.
HELENA DO BODE – Nascido em 1962, filho de Walkir Portela, atleta e árbitro de futebol, Nilton Rasta fala com propriedade sobre o bairro onde cresceu. Ele recorda Helena do Bode, famosa ialorixá (mãe de santo): “Era uma senhora de cor, alta, enorme, devia ter mais de 1,90 m de altura, ou 2 metros. Pesava mais de 200 kg e andava sempre com um bode. Seu terreiro era respeitado e frequentado por grandes políticos da cidade”, relata.
A primeira rua aberta no bairro, depois chamada de Augusto dos Anjos, foi uma concessão de Dona Pomba, que liberou o espaço necessário. “As boiadas passavam pela fazenda em direção ao centro de Feira de Santana, e quando estouravam, era um problema. Com a abertura da rua, os animais seguiam pela Rua de Aurora (Rua Desembargador Filinto Bastos) até o campo do gado, onde hoje está o Fórum e o Colégio Joselito Amorim”, explica.
NILTON RASTA – Em qualquer lugar, a política, assim como o futebol, é marcada pela diversidade de opiniões e escolhas, mas até hoje, os moradores da Rua Nova têm um carinho especial pelo ex-prefeito Colbert Martins da Silva, sempre recebido com gratidão. “O doutor Colbert fez muitas obras, principalmente a urbanização, pavimentando várias ruas e acabando com a lama. Isso ninguém esquece”, diz Nilton Rasta, que, nascido e criado ali, demonstra enorme carinho pela comunidade: “É meu berço, amo a Rua Nova”, afirma