Não é incomum encontrar, em festas, a turma mais jovem sentada bebendo enquanto os pais, tios, avós, esbaldam-se (o verbo esbaldar é maravilhoso e uma pena ter caído em desuso) pelo meio do salão demonstrando grande habilidade em botar fora a malemolência e injetar adrenalina na capacidade de se divertir.
Quando eu era adolescente, nos anos dois mil, na Bahia desenvolveu-se uma música desgraçada com refrões repetindo frases inteligíveis sem o menor sentido. Era um pagode famigerado que os meus amigos idolatravam e infelizmente tocava por quase todos os bares, festas de aniversário, casamentos ou boates que íamos. Mas era apenas isso que conseguia agradá-los. Por muita sorte em algum momento a entidade do bom senso se manifestava no dono da festa que pedia ao DJ que tocasse algo que nós costumamos chamar de música dos anos 60, 70, 80.
Então acontecia assim: de um lado prostrava-se a comissão dos jovens limitados pelo medo de ser piegas (sem saber que transbordavam pieguice) e do outro lado a turba desenfreada de coroas dançarinos sem o menor medo de ser feliz.
Enquanto os meninos, com cara de marido, seguravam a cintura da namorada e com a outra mão, um copo, posando de sou “homem já”, os que já passavam de meio século se atiravam na liberdade de dançar como se ninguém estivesse olhando, rodopiando suas parceiras que já usavam sapatos rasteiros, pois já conseguiam entender que conforto e paz valem muito mais que estar na moda.
O último show que fui, há 15 dias, começou com uma moça bem bonitinha, dessas de aparente vontade de parecer americana, e terminou com uma banda denominada Caras e Coroas. O nome é clichê, bem verdade, mas o repertório e a maneira como consegue levantar o público é fenomenal.
Sem surpresa da minha parte, a maioria dos jovens não quis esperar a última banda, provavelmente quando viram os velhinhos subindo ao palco.
É sintomático e merece estudo a música feita na atualidade não agradar o pessoal de mais idade, como também é sintomático que esse mesmo pessoal não se sinta representado pela música feita por e para os jovens. Vale mesmo um estudo, se já não há.
O fato é que, cantando em coro de olhos fechados e jogando seus corpos limitados pela idade e gravidade, mas completamente libertos do preconceito que impede as alegrias, o público rompeu a madrugada com nostalgia, olhares cúmplices e muita boa música.
Dentro do cenário de realização plena, satisfeito do suor que encharcava a roupa, parei por um momento, observei a cena e me lembrei de Nelson Rodrigues: Jovens, envelheçam rapidamente.
Caíque Marques