Quando cursava o ginásio no Colégio Estadual de Feira de Santana, naquele belo prédio da Rua Direita, meados da década de 60, o professor de educação física chamava-se Sargento Aranha. Homem robusto, lutador em várias modalidades, fama de truculento, porém cordato, desde que não lhe pisassem os calos. Dizia-se que fora transferido para o Tiro de Guerra em Feira em razão da falta de atenção de um oficial que não observou este pormenor e, por conseguinte, passou alguns dias convalescendo em hospital.
Vez por outra, além dos exercícios com halteres de madeira que nós “companhia” apresentávamos em desfile pelas ruas da cidade, o militar formava seleção de futebol para disputar partidas contra outras equipes “inimigas”. Outros colégios, seleções de cidades etc. Para formar a equipe, o primeiro nome escolhido, já com as devidas orientações, era o meu – Soledade!! Você, meu filho, fica aí do lado do campo observando o inimigo. Qualquer movimento suspeito me avisa.
A relação com o sargento era de muita consideração. Ele não abria mão da minha participação como olheiro. Como se aquela atuação fosse muito importante para os resultados dos jogos. Nunca percebi movimentos suspeitos, a menos de um torcedor de time adversário que levou um bode para a lateral do campo, retirado após ameaça do sargento – com seu inseparável facão de 30’’ – de transformá-lo em churrasco. A minha experiência como X-9 foi deveras insossa. De minha parte tinha convicção de que, como futebolista, era autêntico perna de pau, capaz de perder gol feito. Conhecendo minhas limitações procurei ajudar o time dos colegas de duas formas: ficando fora de campo e evitando sabotagens.
O presidente Bolsonaro deveria ter essa sabedoria/humildade. Ele é reconhecido como pessoa limitada intelectualmente. A Presidência da República é função que exige formação que ele não tem. A maioria absoluta das pessoas que o elegeu não o fez por suas qualidades – que, aliás, diminuem com o passar do tempo – mas pelos defeitos dos seus opositores. Esses, sim, tornam-se cada dia mais numerosos e inquestionáveis. Bolsonaro é inseguro, muito influenciável, desastrado, atrabiliário, confuso e de pouco pensar. Cumpriu com louvor seu papel de tirar o país das garras dos apátridas venais. A sensatez sugeria que ele formasse gabinete de notáveis e, tão somente, cobrasse a concretização de suas promessas de campanha: emprego, saúde, educação, segurança e reforma do Estado. Para nossa desdita meteu os pés pelas mãos, danou as relações com outros protagonistas, internos e externos, sendo hoje fonte de instabilidade política e econômica. Como desgraça complementar acumpliciou-se com os filhos, que, além de boquirrotos, desarrozoados e inconfiáveis, são suspeitos de malfeitos. Bolsonaro é um dos principais responsáveis por esta balbúrdia na qual o Brasil se encontra. Desemprego, estagnação econômica, crise de confiança, falta de credibilidade. Precisamos urgentemente de líderes civis comprometidos com o desenvolvimento econômico e social do país. Eles devem fazer aquele papel decisivo do Sargento Aranha: assumir a responsabilidade de escalar o time e deixar à margem do campo quem atrapalha. Seja por falta de habilidade, competência, má-fé ou por pretensão estúpida. Uma receita válida para os chefes dos três poderes.
Pais e mães de famílias não podem continuar desempregados porque deputados e senadores não trabalham cinco dias por semana; porque barganham benefícios pessoais como condição para discutir e votar as reformas que o país tanto precisa; porque priorizam seus interesses mais mesquinhos, por vezes desonestos. O ministro Sérgio Moro – uma das reservas morais que ainda restam – deveria deixar o governo e comandar cruzada cívica Brasil afora, Norte, Sul, Leste, Oeste, ladeado por brasileiros e brasileiras comprometidos com o povo, Janaina Paschoal, Eliana Calmon, Modesto Carvalhosa, Alvaro Dias, Oriovisto Guimarães, Flávio Arns e muitos outros. Deveriam conclamar a população e exigir as mudanças políticas, sociais e econômicas que não podem continuar postergadas, justamente pelos que ganham altíssimos salários pagos pontualmente. O Brasil não tem tempo a perder. Nosso futuro como nação está em jogo agora.
Pensemos juntos:
- A média salarial no Brasil é de R$ 2.340,00. Na região Nordeste, é menor que dois mil reais. Como medida provisória poderia ser estabelecido o teto de R$ 23.400,00 para pagamento em moeda corrente dos salários de servidores federais, estaduais e municipais. O restante, quando fosse o caso, seria pago com título/ bônus do Tesouro Nacional negociáveis, resgatáveis após dois anos com juros e correção monetária desde que o país tivesse crescido mais de 5% no ano anterior – taxa necessária para autossustentabilidade segundo alguns economistas. Assim estaríamos todos lutando e torcendo pelo crescimento do Brasil.
- Somente com o item Dívida – rolagem (22,4%) e juros (11,2%) – nós, contribuintes , gastamos um terço do Produto Interno Bruto, mais de 1 trilhão e 100 bilhões de reais. Imaginemos alguém que gasta demasiado com o aluguel da casa onde mora, mas, ao mesmo tempo, é locador de muitas outras pequenas propriedades que rendem pouco. A solução óbvia é vender os imóveis pela melhor oferta e adquirir a casa de moradia para se ver livre do aluguel. A União, Estados e Municípios têm muitos imóveis sublocados, por vezes abandonados. A Dívida pode ser abatida, com essas transações imobiliárias, realizadas pública e honestamente. Em Feira, o Exército tem uma área praticamente dentro da cidade. Ela poderia ser permutada por outra muito maior, estrategicamente localizada na zona rural do município com grande compensação financeira. Entrementes, parte da área atual poderia permanecer propriedade do Exército para replicar aqui uma unidade do IME, Instituto Militar de Engenharia, faculdade técnica de alto nível. Ganharíamos todos.
- Um dos maiores navios cargueiros do mundo, o dinamarquês Maersk Triple E, viaja com somente 13 tripulantes. Esta é a média para os grandes navios de carga, seca ou petroleiros. Oficiais e marinheiros não têm interesses substanciais nas operações dos navios além dos seus próprios salários. O governo bateu cabeça, gastou dinheiro, envolveu universidades, Marinha, Exército, grande número de voluntários e até hoje não descobriu o navio responsável pela catástrofe, pelo crime. Acusou companhias, anunciou a solução, desmentiu se em seguida. Coisa de gente incompetente. O Executivo, através de uma de suas agências, poderia ter oferecido recompensa de 1 milhão de dólares aos que – anonimamente ou não – apresentassem provas que levassem aos autores do atentado. Em 48 horas saberíamos tudo a respeito. Conversei com um amigo sobre a proposta e ele só discordou em um ponto. Na sua opinião, 500 mil dólares bastariam. É isso! Quem assistiu a filmes de faroeste sabe que caçar bandidos envolve “Reward”, como dizem os gringos.
Continua na próxima semana.
Prof. Teomar Soledade Júnior.