
Em janeiro de 1997 causou alvoroço na Feira de Santana a notícia de que o traficante carioca José Roberto da Silva, o “Robertinho de Lucas”, estava residindo na cidade havia dois anos. Mas não apenas isso: ele até se estabelecera como comerciante por aqui. Naquela época, “Robertinho de Lucas” era o criminoso mais procurado pela polícia do Rio de Janeiro. Uma agência de notícias divulgou a informação para o Brasil inteiro, colocando a Feira de Santana no noticiário policial nacional.
A prisão do traficante aconteceu na Estação Rodoviária do Recife, em 8 de janeiro. Lá, ele aguardava o desembarque da mulher e da filha de um ônibus interestadual. Foi capturado por agentes da Polícia Civil do Rio de Janeiro e, no mesmo dia, recambiado para aquele estado. Aquela prisão rendeu manchetes nos jornais e longas matérias na tevê. No mesmo dia, circulou a notícia de suas conexões com a Feira de Santana.
Era fake news – expressão que não se usava à época –, conforme esclareceu, por telefone, o delegado Rasik Louzada Aride, à reportagem do extinto jornal Feira Hoje. Ele integrava a equipe que participou das investigações: “O diretor conta que durante toda a investigação (que durou quatro meses), em nenhum momento os policiais tiveram qualquer indício de que ‘Robertinho de Lucas’ teria qualquer ligação com a cidade em seus negócios”.
“Robertinho de Lucas” tinha vasto patrimônio, segundo a matéria: era dono de 30 imóveis, mas nenhum deles ficava na Bahia. No depoimento, o traficante afirmou que estava residindo em Aracaju havia cinco anos. As ligações do criminoso se limitavam ao eixo Rio-São Paulo e a Aracaju, apurou a polícia. Na oportunidade, o delegado acrescentou: “De acordo com Rasik, o paraíso para os traficantes são cidades como Recife, Fortaleza, Natal e Porto Alegre, essa no Sul do País”.
Na época, muitos apressados asseguravam que a Feira de Santana já integrava o circuito do crime organizado que se espraiava a partir do Rio de Janeiro. Naqueles tempos, o Primeiro Comando da Capital, o PCC, apenas surgia nas prisões paulistas. E as facções que tanto aterrorizam a população hoje – e que, de fato, se vinculam ao crime do eixo Rio-São Paulo – só surgiram, por aqui, no começo da década seguinte. O crime apenas começava a se profissionalizar.
O episódio causou alvoroço na Feira de Santana. Naquela época, a violência começava a crescer de maneira persistente. Os homicídios, por exemplo, iam aumentando ano a ano. Mas o crime era pouco profissional por aqui: no máximo, aparecia uma quadrilha mais estruturada, com modus operandi importado das metrópoles do Sudeste. Às vezes acontecia um grande assalto, normalmente protagonizado por bandidos do Rio, de São Paulo ou Salvador.
Desfazer aquela fake news exigiu mais de um dia. Naquela época, a comunicação era menos ágil e as apurações costumavam ser mais criteriosas e mais lentas, até pelas limitações tecnológicas. Celular – o aparelho servia só para falar – era novidade recente. E a internet era uma promessa que só começou a se popularizar a partir da década seguinte. Existiam poucos sites noticiosos, com acessos escassos.
Em suma, ao lado de Ernaldo Pinto de Medeiros, o “Uê”, “Robertinho de Lucas” era o principal líder do tráfico no Rio de Janeiro em liberdade naqueles tempos. Controlava a comunidade de Parada de Lucas. Expansionista, enveredou por uma guerra tentando controlar a favela de Vigário Geral, também lá na Zona Norte. A carreira terminou em 2005, quando foi assassinado, na Região dos Lagos, também no Rio de Janeiro, num crime com características de execução.
Resgatei a matéria que redigi no saudoso Feira Hoje numa visita à biblioteca do Museu Casa do Sertão, da Universidade Estadual de Feira de Santana, meses atrás. A propósito: vale a pena conhecê-la, lá adiante, no pós-pandemia.
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