Quase não se vê mais bancas de revistas no centro da Feira de Santana. Nos bairros, então, nem se fala: praticamente foram extintas. Jornais e revistas tornaram-se artigos secundários nas bancas que sobrevivem. Capa para celular, água mineral, refrigerante, – até lanches – brinquedos, artigos de papelaria, bibelôs chineses e prosaicos chaveiros tornaram-se os principais produtos. E, claro, há também jornais e revistas para aqueles que teimam em não se desapegar do papel. Vê-se também livros – religiosos ou de autoajuda – disponíveis nas prateleiras.
As livrarias sempre foram escassas aqui na Feira de Santana. Só em décadas mais recentes é que surgiram algumas pela cidade, quase sempre nos shoppings. Portanto, durante muito tempo, as bancas de revistas eram as únicas mediadoras entre leitores e livros de literatura ou filosofia, por exemplo. Isso quando eram lançadas aquelas séries – “Os Pensadores”, “Mestres da Literatura Universal”, “Os Economistas” e por aí vai –, acessíveis a quem não podia frequentar as livrarias soteropolitanas.
Num mundo analógico, a única forma do cidadão mergulhar nos clássicos da filosofia ou da literatura era adquirindo essas séries, lançadas com regularidade. Quantas vocações profissionais não desabrocharam a partir do contato com essas publicações, sempre disponíveis por preços módicos? Quanto lazer de alta qualidade não proporcionaram? Hoje até essas séries estão mais escassas, assim como as bancas de revistas.
Há quem desde já aponte – língua em riste – a derrocada do livro de papel, sua substituição pelos meios digitais. Recitam o clichê em qualquer circunstância. Texto publicitário ou matéria de jornal, vá lá. É leitura curta, efêmera. Os grandes empreendimentos do pensamento, não: quem se sente à vontade em prolongadas leituras de Espinosa, Schopenhauer, Kant ou Hegel na tela do computador? Quem vai se deleitar com Saramago, Guimarães Rosa ou Dostoievski preocupado com a barra de rolagem na tela? Não: o livro permanece indispensável.
Fraco de bolso e sem traquejo com a leitura, o brasileiro compra poucos livros. É o que revelam inúmeras pesquisas desde sempre. Como os custos fixos são elevados e as tiragens médias pequenas, o resultado são preços salgados para a realidade – e sobretudo o bolso – do brasileiro. Daí a ausência de livrarias, a incontornável reconfiguração das antigas bancas de revistas, que vendem até pipoca doce e biscoito recheado.
Mas, por aqui, tudo sempre pode piorar. Pois o badalado ministro da Economia, Paulo Guedes – aquele que foi chamado de “Tchutchuca” – pretende taxar os livros no futuro. Estimativas apontam que o preço deve subir até 20%. Segundo ele, livro é coisa de “rico”. E o pobre que lê? Esse vai receber livros do governo, segundo o expoente do piraquara liberalismo brasileiro.
Imagino que, para os pobres, serão distribuídos bíblias e cartilhas de empreendedorismo. E bíblia miúda, daquelas que fazem o infeliz lacrimejar quando tenta ler. Ninguém poderá acusar os novos donos do poder de incoerência. Afinal, com livro e leitura, povo nenhum elege essa gente que está aí, aboletada no poder…
Na foto, a banca de cordel de Jurivaldo no Mercado de Arte Popular
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