O adeus de Zequinha nos golpeou feito tabefe, estalado, seco e repentino, em plena sexta-feira, dia emblemático para os amantes da cerveja gelada e da sua inconfundível e saborosa picanha.
Ora, não me venha falar em acaso! Se é para recordá-lo que seja inevitavelmente pela magia de uma típica sexta-feira! Ansiosa, plural, pretensiosa…
Quem de nós saberia quando e como começou esta nossa insaciável sede pelo dia mais esperado da semana?! Que merda de domingo quê, responderia nosso querido Zequinha, tomado por seu irrefreável mau humor que acabava por nos contagiar. Tão importante e necessária que se tornou verbo: sextou!, gritam hoje em dia.
Frases curtas, presença forte, sorriso quase sempre discreto e uma obstinada capacidade de reconhecer as pessoas da sua cidade: os jornalistas, os publicitários, os políticos, os fazendeiros e empresários, os desocupados, os vendedores de bugigangas, os desfrutáveis, os malas, as famílias, os malucos (em geral, aqueles no estágio de ainda não jogar pedra)… Todos se reuniam lá por motivos variados, quase nunca aleatórios, a bem da verdade!
Num primeiro momento, atraídos pela melhor picanha da cidade, ao ponto, suculenta, sabor inesquecível! Nem sempre tão suficientemente generosa como gostaríamos, pois era fácil nos deixar com aquele gostinho de “quero mais!” A cerveja também sempre foi convidativa, da boa, bem gelada, nunca como daqueles bares preguiçosos que, em pleno dia de final de campeonato, chega a sua mesa quente e sem graça, destoando da sexta-feira.
Dediquemos algumas poucas linhas aos acompanhamentos – tropeiro com torresmos e farofa deliciosos, salada fresquinha. O pão de alho e o queijo na brasa… Huuuummm!
Não há aquele som insuportável, que agride os ouvidos. O boteco-restaurante existe para cultivar a boa conversa, um bom dedo de prosa! Quantas paqueras, romances e affaires vingaram naquelas mesas! Quantos negócios fechados e juras de amor trocados. Não mais um simples bar, uma mera esquina, Zequinha já era reduto. Como se não bastasse, era amigo! Vai seguir levando consigo segredos de muita gente importante da cidade.
E nem todos sabiam, mas o cara ainda escondia um coração generoso. Bom filho, amoroso irmão, dedicou sua vida ao trabalho, ofício herdado do pai. O bar era sua vida! Estava lá todos os dias.
Se por um lado tentava guardar sua eloquência, vez por outra, enchia nossas tardes-noites com seus comentários recheados de sagacidade e ironia! Só as pessoas de uma astuta inteligência o conseguem – desprovidas de pretensão e vaidades, do alto do seu singular poder de observação, escondidas naquela aparente distração.
Não ouviu?! Ficou sem entender?! Problema seu. Teria que frequentar a esquina mais boêmia da cidade mais vezes para compreender aquela dinâmica só dele!
Nós, os jornalistas, já cultivamos uma nostálgica paixão pelos bares boêmios. Tratamos de relaxar, trocar alguma incontida ideia – antes presa nas entrelinhas do impresso, hoje restrita ao apressado e caótico mundo das redes sociais. Não é fácil!
Não fosse motivo suficiente, nutrimos pelo Ponto do Zequinha um carinho a mais porque o antigo Bloco Zero Hora e seu sucessor, o Filhos da Pauta, se concentraram lá nos últimos anos. A sensação de pertencimento que nutrimos por certos lugares. Recordações de quando a Micareta era mais contagiante e, numa única noite, nos reuníamos em torno do propósito ir à forra em plena festa momesca. Tinha tudo a ver com ele!
Bom, meu caro leitor, se você está aguardando nestas linhas finais um outro desfecho, lembre-se que é mais aprazível não se despedir totalmente de caras como Zequinha. Vamos ficar para sempre com suas pitadas mal-humoradas que não faziam mal a ninguém. Vamos vibrar por ele a cada sexta-feira e desejar sua picanha saborosa cada vez que pensarmos numa boa comida. Aiii, dá água na boca só de lembrar!
Você nos deixará sempre com saudades, mestre churrasqueiro! Vá com Deus!
Lineia Fernandes
Jornalista
foto de Cristiane Melo