O Grupo de Trabalho (GT) Multidisciplinar Conflitos Socioambientais, do qual faço parte, é um grupo composto por professores, estudantes e técnicos administrativos de diversas especialidades e Instituições Públicas de Ensino, como a UEFS, o IFBA e a UFRB, e também por representantes quilombolas e da zona rural do Território Portal do Sertão. O GT foi constituído para discutir demandas em torno de problemáticas e necessidades das comunidades quilombolas e rurais do Território, a saber, o processo de expansão urbana sobre o campo e comunidades tradicionais, a ampliação e a implantação de rodovias que impactam na qualidade de vida e nos direitos desses sujeitos, o impacto socioambiental de grandes obras de infraestrutura, etc.
Neste texto, o objetivo é discutir um dos grandes problemas que têm afetado a tranquilidade das comunidades rurais e do Território: a possível implantação de uma Linha de Transmissão (LT) de Energia, a LT 500 kV Porto de Sergipe – Olindina – Sapeaçu C1. Apresentarei uma breve sistematização, baseada em debates transmitidos na internet, que fiz sobre esse assunto. O mero fato de haver uma linha de transmissão por perto já significa riscos relacionados aos possíveis acidentes com ela. No entanto, o foco deste texto não é nos problemas vindos de acidentes, e sim nos problemas que o próprio funcionamento normal da linha já pode criar.
Isso vem dos campos eletromagnéticos que ela causará: a alta tensão cria um campo elétrico intenso, e a alta corrente cria um campo magnético intenso, que por sua vez têm os efeitos listados abaixo:
Interferência em frequências de rádio. A alta tensão ioniza o ar perto dos cabos e causa pequenas descargas elétricas. Isso cria um ruído que atrapalha transmissões de rádio e TV, e também de internet via rádio. O nível desse ruído é limitado por lei, mas sempre haverá um pouco [1]. Quem já tem sinal ruim, corre o risco de ficar sem sinal nenhum.
Barulho. As mesmas descargas elétricas que produzem ruído de rádio também causam ruído sonoro [1]. As linhas de transmissão produzem um zumbido, que fica mais intenso com neblina e com chuva. Quem está acostumado com o silêncio do campo aberto, pode se incomodar com a diferença.
Raios. As linhas de transmissão são estruturas altas e possuem seus próprios para-raios. Portanto, elas tendem a atrair raios para cair nelas mesmas.
Formigamento e choques. Na região imediatamente abaixo dos cabos de alta tensão, a intensidade do campo elétrico produzido é suficiente para causar sensação de formigamento em algumas pessoas. Além disso, nessa região, objetos e pessoas que não estejam aterrados (ligados ao chão por material condutor) podem ficar eletricamente carregados e dar pequenos choques. Por exemplo, um trabalhador que suba numa escada de madeira vai estar isolado do chão e vai adquirir uma carga elétrica. Se um colega com os pés no chão entregar uma ferramenta para ele, pode haver um choque em ambos. Algo assim não é letal, mas o susto pode causar outros acidentes [2].
Interferência com marcapasso. Os campos eletromagnéticos das linhas de transmissão podem interferir com o funcionamento de marcapassos, que são equipamentos usados por pessoas com problemas cardíacos. As normas que limitam a intensidade desses campos são feitas para pessoas de saúde normal. Portanto, quem usa marcapasso e passa perto de linhas de transmissão deve informar a seu médico sobre isso para saber se deve tomar precauções adicionais [3].
Controvérsia sobre risco de câncer. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, lugares com campo magnético intenso, como os de uma linha de transmissão, têm uma incidência maior de leucemia infantil, um tipo de câncer que ocorre em crianças. Não está comprovado se a causa disso são mesmo os campos magnéticos. No entanto, se for verdade, eles estariam causando 2.900 dos 49.000 casos anuais de leucemia infantil por ano que ocorrem no mundo [3].
Zelando pelo bem estar e direitos das populações e meios ambientes atingidos, o GT busca promover clareza e precisão da informação disponível, devendo, portanto, ser observado que não é certeza que esses piores resultados acontecerão, mas é um risco para o qual os moradores nas vizinhanças da LT 500 kV deverão estar atentos em um futuro próximo, caso haja a implantação.
Referências:
- DOSSEL, Relatório Ambiental Simplificado [RAS], LT 500 kV Porto de Sergipe – Olindina –Sapeaçu C1. 2019. pp. 38-39.
- OMS, Extremely Low Frequency Fields. 2007. p.121.
- ICNIRP, ICNIRP Guidelines for Limiting Exposure to Time-Varying Electric and MagneticFields (1 Hz – 100 kHz). 2010. p.2.
Jairo Cavalcanti Amaral é Professor da UFRB e Engenheiro Eletrônico, além de membro do GT Conflitos Socioambientais (UEFS, IFBA, UFRB, UNEB)