Tantos natais preciosos ao lado da amada Maria. Brincando, lá se vão 36 anos … Lembro-me, que nessa época de Natal ela costumava se virar de todo jeito para encontrar uma forma possível de realizar a bela festa, a significativa confraternização, a acolhida de coração. Presentear a todos era impossível. Éramos muitos…Não devia ter sido fácil. E como dizia sua irmã Teodora Maria: era uma luta!
Sempre à noite, a nossa Maria saia em passeio pelo comércio iluminado da cidade, a fim de repor os adereços natalinos da última festa: festões coloridos, velas, castiçais, folhas secas pintadas de dourado, ponteira da árvore e cartões natalinos endereçados a outras tantas Amigas Marias: Maria Alice, Maria Tereza, Maria Eulina, Maria de Gonçalo… Mas a grande compra era a das bolas natalinas de vidro. Eram lindas, de todos tamanhos e cores, com um brilho inigualável e sem as horríveis emendas das bolas plásticas. Quando se quebravam, corríamos para calçar as sandálias, tamanho era o medo da “fabulosa história” do tétano e do que tal corte poderia causar.
Adorava me aproximar das bolas de vidro para ver rosto aumentar, diminuir e magicamente ficar estranho. Era uma diversão! Perigosas, sim! Mas sedutoramente mais lindas, principalmente quando penduradas nas grandes palmeiras que haviam em nosso quintal. Após as compras, na volta pra casa, à última parada era a do forte abraço em Maria da Loja A Violeta, das mãos de quem comprava o bramante para os novos forros das almofadas. Em casa, era um tal de mudar as coisas de lugar, que por pouco não se confundia como uma mudança de regresso para o seu Rio Grande do Norte. A arrumação era grande, e logo o chão estava deslizando de “Cera Parquetina”. A enceradeira vermelha, prestimoso presente de filha, dava o acabamento do brilho final.
Dessa vez, ninguém reclamava dos afazeres. Nem a Pola, a quem se acarretava maior confiança nas tarefas, uma verdadeira especialista em ceras, óleo de peroba e pasta cristal. Não haviam queixas, era Natal e seu espírito já prenunciava tais atitudes. Hora de preparar e encomendar as guloseimas e mais uma vez outra Maria se destaca em nosso cenário natalino. Dona Maria, mãe de Rosália, providenciava a entrega das lindas e deliciosas frutas cristalizadas: figos, pêssegos, abacaxis, damascos, goiabas e bananas, muitas bananas, as minhas prediletas!
Na decoração da mesa e das bandejas não poderia faltar os laçarotes de fitas, comprados sempre de última hora no Armarinho São Jorge.
Na radiola Stéreo Philips, era tempo de ouvir o velho compacto duplo “A Harpa Celestial”, as mesmas quatro canções do ano passado. No lado A só as Natalinas: Jingle – Bells e Natal das Crianças. No lado B: Boas Festas e Feliz Ano Novo. Aquelas canções soavam como um ritual de passagem e parecia nos deixar mais solícitos e harmônicos.
Na Praça da Matriz, onde morávamos, os sinos da Catedral prenunciavam a Missa do Galo e antes que desse seu badalo final de meia noite, lá estava nossa Maria… Pronta! Linda! Radiante! O cheiro de seu perfume Lima da Pérsia intensificava a sua simplicidade e elegância de grande mulher. Por várias vezes treinei usar o seu cheiro, mas aquela era uma alquimia só sua, que exalava um extrato de amor, de vida e de esperança.
Que saudade daqueles Natais, onde a Senhora puxava a oração para a ceia e íamos dormir, na certeza dos presentes: Tippy pra mim, Susi ciclista pra Gleide e outras tantas bonecas, ursos, bolas dente de leite e carrinhos reservados apenas para as suas crianças: as de casa e as do orfanato, que a Senhora conhecia pelos nomes e que não tinham um Papai Noel, mas tinham uma Maria…Por conta disso, seu Almir da Liparbe – Livraria, papelaria e brinquedos também tinha a melhor de suas freguesas.
O tempo passou… A nossa árvore de Natal nunca mais foi à mesma, mas continuamos reunidos e sua família, como uma grande árvore de vida, está cheia de novos galhos, novas flores, novos frutos… Todos advindos da força do seu amor, da sua coragem, da sua renúncia. Com certeza, Minha Mãe, minha Maria, o seu nome estará para todo sempre gravado na galeria das mulheres virtuosas da vida. Coincidência ou não, o legado das Marias, vindo de tua mãe, foi dado a sua filha mais velha Maria Dalva e a sua filha mais nova Ana Maria. Gratidão pelo seu nome em meu nome. Ah, Maria! Um nome que tem algo que afaga. É um belo nome de mãe, é um doce nome de filha, que se traduz em saudades e esperança de um lindo reencontro…Até lá, minha mãe, minha Maria (Marizinha)!
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