A eleição para prefeito de Feira de Santana em 1988, além de ser a primeira eleição verdadeiramente pluripartidária com 13 partidos disputando o direito de governar o maior município do interior da Bahia nos próximos quatro anos, teve como grande novidade a chegada da TV Subaé. Pela primeira vez teríamos debates televisivos na eleição feirense, rodadas de pesquisa do Ibope indicando como estava a disputa e ainda o horário eleitoral gratuito na TV. Até então, a eleição local se limitava aos programas eleitorais de rádio, mas sem maiores reflexos na disputa. A chegada da primeira emissora Globo no interior da Bahia esquentou de vez a disputa local. Tudo era novidade. A TV Subaé tinha apenas cinco meses de inaugurada quando o feirense escolheu o último prefeito da década de 80. No jornalismo, a equipe ainda estava ajustando os primeiros passos na Plim-Plim, muitos agora tendo que aprender na prática como conviver com as dificuldades de quem vinha do impresso, como eu, e cumprir a rigorosa legislação eleitoral.
A eleição municipal é a mais difícil para trabalhar. Os nervos estão à flor da pele, a disputa é renhida, muitas vezes gerando inimizades, e qualquer vacilo na cobertura pode trazer consequências graves, principalmente com a justiça eleitoral. Há 34 anos Feira tinha quase três vezes menos eleitores do que hoje. Apesar de 13 candidatos a prefeito, quem disputava os 120 mil votos feirenses eram mesmo o velho Colbert, pai do atual prefeito, e Sérgio Carneiro, um jovem iniciando a carreira política que trazia como trunfo o fato de ser filho do governador João Durval. Disputa dura, mas que terminou com a vitória do líder político do PMDB, que retornava ao comando dos destinos da prefeitura substituindo José Falcão, do então PDS.
Colbert e Sérgio montaram as maiores estruturas de campanha. Todos os esforços se concentravam na montagem dos programas de TV, o que exigiu a formação de equipes vindas de fora a peso de ouro. Quem viveu aquela época deve lembrar da polêmica que gerou na cidade quando o programa de Sérgio colocou um clip com imagens de uma pessoa andando a passos vigorosos na cidade, mostrando somente as pernas do personagem. Para os peemedebistas, aquilo era uma provocação e associaram a peça publicitária com o fato de Colbert ser um cadeirante. Os marqueteiros aproveitaram para contra-atacar e colocaram Colbert como vítima.
O primeiro palanque eletrônico fervia e a justiça eleitoral recebia a toda hora pedidos para retirar do ar algum material exibido no programa do adversário e garantir direito de resposta. A juíza responsável pela fiscalização da propaganda eleitoral era uma pessoa extrovertida e polêmica, cuja figura lembrava a Viúva Porcina, personagem que brilhou na novela Roque Santeiro ao lado de Lima Duarte. Cansada de tantos pedidos de direito de resposta, a ilustre magistrada, também uma neófita em campanhas eleitorais eletrônicas, radicalizou e montou plantão na TV Subaé. Acompanhada de oficiais de justiça, foi para a sala de controle master, onde eram exibidos os programas eleitorais, e sentou ao lado do operador. Ali decidia na hora o que era para ser cortado com o programa em plena exibição: “corta”, ordenava quando achava que o programa cometia alguma irregularidade. Uma loucura que acredito não ter precedente em outras eleições Brasil afora.
Nesta época, todas as emissoras afiliadas da Globo exibiam no domingo de manhã um programa de entrevistas chamado “A Palavra é Sua”. Era um espaço onde um convidado era sabatinado toda semana sobre algum assunto relevante. Em pleno período eleitoral, nada melhor do que convidar a juíza para falar das eleições, A gravação do programa foi surpreendente, bem no estilo da nossa convidada. Na primeira intervenção, a repórter Aline Hungria (foto), que foi nossa primeira apresentadora do jornal do meio-dia, pediu que a juíza orientasse os eleitores sobre algum assunto referente ao pleito. Uma pergunta tipo “o eleitor pode ir votar usando camisa com propaganda eleitoral?” A juíza estrilou. “Ah, minha filha, eu não tenho tudo na cabeça. Tem que olhar no código eleitoral”. Ato contínuo, começou a folhear o grosso livro que estava em seu colo em busca da resposta. E foi assim em todas as perguntas até que a apresentadora desistiu e deu por encerrada a entrevista que deveria durar 25 minutos e só conseguimos aproveitar 5 minutos.
Marcílio Costa é jornalista, gerente de Jornalismo da TV Subaé, Feira de Santana.