– O pessoal ligou para a rádio [a rádio Subaé AM] e disse que encontrou um objeto metálico, esquisito, no meio do mato. Desconfiam que pode ser o pedaço de um satélite, de uma nave espacial…
A mensagem veio pelo aparelho de comunicação do carro do extinto Jornal Feira Hoje, que integrava o Sistema Nordeste de Comunicação, junto com a Subaé AM. Moradores dos Três Riachos encontraram o objeto estranho e trataram de ligar para a emissora. Naquela época a comunidade limitava-se a uns quantos barracos, precários, espremidos entre as águas do Jacuípe, o barranco íngreme – apinhado pela inextrincável vegetação sertaneja – e a BR 116 Sul.
A equipe de reportagem decidiu se deslocar para a comunidade longínqua naquele radioso final de manhã de 1996. A mensagem – transmitida por um dos operadores de áudio da emissora – não era troça, nem piada. Provavelmente não era pedaço de nave espacial, óbvio. Mas aquilo despertou a curiosidade da equipe.
Não foi difícil chegar lá porque, por coincidência, o carro da reportagem deslocava-se por aquela região da cidade. Avançamos em maio à procissão de caminhões ruidosos e fumacentos que congestionavam a BR 116. Também não foi difícil localizar a pequena aglomeração às margens da rodovia. Gente simples, humilde, que arriscava-se a fixar residência naqueles ermos.
Galgamos o aclive e a pequena aglomeração se desfez, permitindo que nos deparássemos com o objeto: era apenas um retroprojetor, analógico, deixado ali no meio da vegetação espinhosa até com alguma delicadeza, bem perto da pista. Alguns moradores falaram, sobretudo o responsável pelo achado – sujeito simples, de meia-idade – que aventurara-se numa expedição qualquer pelas proximidades e que, na volta, localizara, alarmado, o objeto.
Ficamos um pouco desapontados. Se fosse parte de algum satélite caído do espaço, a reportagem alcançaria ampla repercussão. Desfeita a confusão, ficou a dúvida: o que um retroprojetor fazia ali, às margens da BR 116, no meio dos juremais, intacto?
O mistério durou pouco tempo. Na véspera, uma professora universitária fora assaltada. Levaram seu veículo, com o retroprojetor no banco traseiro. Descartaram o aparelho – para os criminosos, provavelmente uma geringonça – e sumiram com o carro. A atenta equipe da reportagem policial do Feira Hoje já dispunha da ocorrência para complementar a matéria.
O episódio, hoje, soa até engraçado, nesses tempos de intensa intimidade com a tecnologia. Mas, naquela época, telefone celular servia só para falar e era privilégio de poucos brasileiros abastados; Os computadores apenas começavam a se popularizar nas empresas, nas agências bancárias, nas repartições públicas; Acesso à internet, então, era coisa de ficção científica. Daí o espanto e a dedução ingênua daquelas pessoas nos Três Riachos.
Novidade naqueles tempos de transição do mecânico para o digital, hoje os retroprojetores analógicos estão ultrapassados…
Imagem gerada pela inteligência artificial DALL·E
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