Ao receber a Comenda Maria Quitéria da Câmara de Vereadores de Feira de Santana , o arcebispo Dom Zanoni Demettino , referiu-se no seu discurso ao “crescimento assustador das mortes em nossa Bahia” , pondo-se à disposição para implantar, junto com a Câmara, uma cultura de paz. Ele referiu-se diretamente ao assassinato da quilombola e Yalorixá Mãe Bernadete.
O assassinato brutal da liderança quilombola, Ialorixá Bernadete Pacífico repercurtiu grandemente. Conclamamos às autoridades competentes, justiça por meio da punição dos culpados, como também, celeridade na homologação das terras quilombolas no país.
Leia na íntegra o discurso de Dom Zanoni:
Para mim é motivo honra e profunda alegria vir novamente a essa casa, lugar tão valioso e significativo para a municipalidade, receber a Comenda Maria Quitéria, aprovada por unanimidade. Agradeço de coração a deferência dos senhores e senhoras para com minha pessoa com esta homenagem tão grandiosa. Compreendo não como uma honra pessoal, mas como o reconhecimento de uma instituição que desde as origens tem contribuído para na gestação desta cidade, na formação do seu povo, no desenvolvimento de sua cultura.
Há um laço estreito que une a Igreja e a Câmara Municipal da Feira de Santana. Aos 18 de setembro de 1833 na Capela de Santana, hoje, Catedral Metropolitana de Sant”Anna realizou-se o Ato de Instalação, Posse e Juramento da primeira Câmara Municipal da Nova Vila do Arraial da Feira de Santana, cuja mesa diretora, presidida pelo Tenente Luiz Ferreira da Rocha, teve como secretariado Joaquim da Silva e Almeida, da Câmara Municipal da Vila de Nossa Senhora do Rosário do Porto da Cachoeira (Cachoeira), que empossaram aos sete vereadores eleitos: Capitão Manoel da Paixão Bacellar e Castro, Joaquim Caribé Morotova, Antonio Honorato da Silva Rego, Padre Manoel Paulino Maciel, Capitão José Joaquim Pedreira Mangabeira, Antonio Manoel Vitória e Padre Luiz José Pinto da Silva. Por muito tempo as secções da Câmara foram realizadas na Capela de Senhora Santana, por motivo do poder legislativo não dispor de uma sede própria.
O Brasil tem atravessado um dos períodos mais difíceis de sua história. Estivemos sujeitos a um terrível golpe contra o estado democrático de direito e nossa jovem democracia. Ainda é presente o que significou o ato de força de 1º de abril de 1964 que durou longos 21 anos, jogando o País numa noite de terror, prisões, torturas, mortes e desaparecimento de pessoas. Acredito que se o golpe tentado tivesse tido sucesso não estaríamos aqui neste momento.
Presenciamos o terror da guerra em muitos pontos do nosso planeta. Atual , vive-se a guerra na Ucrania. Como afirma Papa Francisco, “vivemos num contexto de guerra mundial em pedaços, de constantes conflitos” Acompanhamos com tristeza e indignação o crescimento assustador das mortes em nossa Bahia. O assassinato brutal da liderança quilombola, Ialorixá Bernadete Pacífico repercurtiu grandemente. Conclamamos às autoridades competentes, justiça por meio da punição dos culpados, como também, celeridade na homologação das terras quilombolas no país.
Mudar é necessário. Em meio a muitas polarizações, a humanidade necessita ser reconciliada, em si mesma e com o cosmo. A complexidade deve ser enfrentada, com amplitude de pensamento, racionalidade coerente e ações que provoquem uma radical mudança.
Não somos indiferentes. O Papa Francisco no seu diálogo com os movimentos sociais na Bolívia: “Não se entende que o amor pelos pobres está no centro do Evangelho. Terra, Teto e Trabalho – isso pelo qual vocês lutam – são direitos sagrados. Reivindicar isso não é nada raro, é a Doutrina Social da Igreja”.
Aqui é o templo sagrado da democracia, espaço onde as minorias e maiorias são contempladas nas decisões políticas dos seus representantes.
Esta casa é o lugar da defesa dos direitos humanos e do incentivo da formação de sujeitos de direitos, onde a cidadania ativa favorece o exercício dos direitos em perspectiva democrática. Embora foram padres os primeiros vereadores aqui é uma Instituição laica, com aquela autonomia que, por sua própria natureza deve estar ligada exclusivamente à autoridade da verdade e da justiça. Por essa razão a minha fala não é uma homilia, nem tão pouco pretende ser um sermão. Desejo com os senhores buscar aquilo que é verdadeiro e bom, não somente para os católicos, mas para todos.Contem comigo para gestação de uma cultura de paz para superar toda violência.
Dom Zanoni Demettino Castro/ Arcebispo Metropolitano