“Comércio na feira/Parou Sol e parou Lua/Parou no meio da rua/O galho em que os dois se encontraram” (A Peleja de Apolo e Pam, de Onivaldo Mendes)
Dizem que em Feira de Santana, a maior cidade baiana depois da capital, da qual dista pouco mais de 17 léguas e meia, começa o Sertão da Bahia. Pois é lá, nas portas do Sertão, que Deus ou o Diabo – ou os dois juntos, vá lá saber! – armou a mais emocionante disputa das eleições municipais de outubro no território baiano. Uma peleja digna de figurar nos romances da literatura de cordel.
A eleição lá será decidida entre dois Zés. O ex-prefeito José Ronaldo de Carvalho (Paripiranga, 18/07/1951), administrador de empresas, filiado ao União Brasil; e o deputado federal José Cerqueira de Santana Neto (Feira de Santana, 30/03/1964), advogado e filiado ao Partido dos Trabalhadores.
Não há espaço para um terceiro nome. Tanto que o deputado estadual Pablo Roberto (PSDB), depois de ensaiar uma candidatura, meteu a viola no saco, reintegrou-se com armas e bagagens no arraial ronaldista e ganhou o posto de vice. Fez bem, ao que tudo indica, pois com a intensificação da polarização entre os Zés, corria o risco de sair da disputa menor do que entrou – ao final saiu ganhando: agora tem um lugar maior entre os players da mesa política da banda que domina o poder municipal há 24 anos.
Bom, há ainda a candidatura de Carlos Medeiros Miranda, do Partido Novo, mas é uma daquelas que entram só para constar, sem constituir ameaça, nem de longe, para os líderes da disputa. Ele foi candidato ao cargo em 2020 e obteve apenas 7.259 votos, o equivalente a pouco mais de 2,5% dos votos válidos no primeiro turno.
Voltemos aos dois Zés, cuja disputa tem seu lado burlesco ao colocar de um lado o príncipe do reino dos que disputam e perdem e, do outro, o cavaleiro do reino dos que disputam e ganham. Confesso que não sei, meu caro leitor, de caso semelhante nesses nossos brasis de tantas e tamanhas bizarrias. Por esse ângulo, o embate beira os enredos fantásticos do romanceiro cordelista.
E vou logo explicando, minha cara leitora, caso não seja de Feira de Santana ou não acompanhe com mais proximidade os humores da disputa política naquela cidade que já deu à história baiana líderes à direita, como o governador João Durval, e à esquerda, como o deputado federal Francisco Pinto – os dois, aliás, teceram armas na disputa pela prefeitura local, lá pelos idos de 1962, vencida pelo segundo, por apenas 42 votos, sendo defenestrado do cargo pelo regime militar pouco mais de um ano depois. Mas isso é outra história. Divago. Voltemos ao busílis, pois.
É que, para usar uma linguagem futebolística, Zé Neto é pentacampeão e Zé Ronaldo é hexacampeão. Mas aqui também vale a famosa regra três, aquela onde menos vale mais. Zé Neto é penta por que já disputou o cargo de prefeito de sua cidade natal cinco vezes.
Perdeu em todas e agora luta para não se tornar hexa. Já Zé Ronaldo é tetra pois disputou quatro vezes, ganhou em todas e agora tenta ser pentacampeão. É ou não é um enredo rocambolesco, merecedor de nossa atenção?
Mergulhados nessa doideira toda estão o governador Jerônimo Rodrigues, petista de quatro costados, e o prefeito local Colbert Martins Filho, emedebista abrigado no bloco de Zé Ronaldo, além de outros líderes dos dois lados, cada qual levando para seus candidatos os ônus e bônus de suas trajetórias pessoais.
Jerônimo, semana sim, semana não, tem ido a Feira de Santana (onde já morou e trabalhou como professor da universidade local), dar apoio ao candidato ungido pela sexta vez por seu partido e levando alguns balaios recheados com os méritos e deméritos de seu governo. Já Colbert, cuja gestão é uma das mais mal avaliadas da história feirense, é um apadrinhado de Zé Ronaldo, que, no entanto, aparenta dele fugir como o diabo da cruz para não herdar a carga negativa do afilhado.
Bom e qual vai ser o resultado da peleja? Calma, meu amável e impaciente leitor. Aqui é recomendável a cautela da sabedoria popular quando diz que resultado de eleição só depois da apuração. Dizem jornalistas e analistas da política feirense que o jogo permanece equilibrado. Não se sabe ainda para qual lado vai pender a maioria do eleitorado.
Mas se ainda não dá para prever o resultado final da peleja, é possível esmiuçar o comportamento dessas duas forças políticos no manejo das peças no tabuleiro para conquistar corações e mentes do eleitorado – o que pretendemos fazer no artigo da próxima semana, esperando desde já contar com a atenção e a boa vontade do leitor.
José Carlos Teixeira é jornalista, graduado em comunicação social pela Universidade Federal da Bahia e pós-graduado em marketing político, mídia, comportamento eleitoral e opinião pública pela Universidade Católica do Salvador