
Um amigo muito mais feirense que eu me diz ter sido o ‘Jóia’ e um que funcionava no posto Shell na pracinha do cemitério, os primeiros motéis da Feira de Santana. Não busquei fontes primárias nessa minha pesquisa. Na pracinha do cemitério que ele fala, ainda alcancei um bar que servia ‘carne assada’. Não exatamente o original de onde teriam saído os rapazes de boas famílias para a imitação cabocla de ‘Hamlet’, no Piedade, uma orgulhosa lenda urbana da Feira de Lucas que saiu até na BBC de Londres…. mas acredito, e assim me garantiram os companheiros do ‘Feira Hoje’ que lá me levaram para o repasto, tão gostosa quanto aquela de antanho.
Mas é sobre motéis a minha pesquisa e esse texto aligeirado para dias tão antipáticos de confusa pandemia.
Pois bem, quando cheguei aqui na década de 70 já existia o Gravatá, ali no Anel do Contorno onde, acredito, ainda funciona a plenos pulmões, ou melhor, a plenos orgasmos. Depois acompanhei, de longe, seja dito, a chegada de outros, como o Cajueiro, o Hollyood, no lado leste do Anel, e depois mais outros e outros em todos os quadrantes dessa que hoje é a avenida Eduardo Froes da Mota ainda sem duplicação, como naqueles áureos anos, na maior parte de seus trechos combalidos.
A Wikipédia me socorre e me situa os motéis no tempo: Há relatos de que os primeiros motéis no Brasil surgiram na década de 1960,em regiões mais afastadas do centro urbano[carece de fontes], mas ao longo dos anos o motel foi cada vez mais se inserindo no contexto da cidade e no cotidiano da população.
Deduzo, com o auxílio luxuoso do achismo, que o motel veio com a crescente urbanização e massificação do automóvel. Motel foi feito para quem tinha carro. Para encontros discretos e sigilosos, longe dos olhos e do escrutínio alheio. Onde aconteciam antes, então, os amores secretos que sempre existiram? Ora, a literatura está cheia de motéis que não eram assim chamados mas que serviam aos mesmos propósitos, com mais glamour e galanteios que só a literatura permite. As garçonières, os inferninhos, as pensões, as casas de recurso…e as camas domésticas das traições espontâneas.
Depois dos motéis tudo ficou mais fácil para o sexo livre ou misterioso. Houve mais amor a partir da existência dos motéis? Não ouso enveredar em assunto sociológico e sensualista tão delicado e científico. Amor não se mede pelo número de motéis. Mas certamente veio desafogar uma demanda reprimida, como se diz na economia. Nessa área, os motéis foram um achado. Tornaram-se um grande negócio, objeto de desejo de capitalistas e investidores sedentos por lucros. Cálculo fácil, feito a partir do IBGE e utilizando a lógica da probabilidade dos encontros, dos desejos e da tesão juvenil das eróticas classes média e alta . A indústria do sexo nunca floresceu tanto quanto depois dos motéis.
Mas como já dizia o vate português que tudo muda, mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, e os motéis também mudaram. Houve um tempo em que quase que perderam a serventia, tão liberal estavam os povos e os jovens e tão carcomida a nossa economia com a inflação que mudava a toda hora o preço das horas. Mas o livre mercado é criativo e se adequa aos tempos. Os motéis passaram a atrair não só os amantes proibidos mas os namorados, os casais, o romantismo, além, claro, da indústria da pornografia e do sexismo.
Mas chega por aqui! Isso não é um TCC e nem tese de pós graduação. Como lhe adverti, leitor, leitora, esse texto é aligeirado e minha incapacidade de alongar profundas reflexões e informações é reconhecida não só por mim mas por muitos dos meus amigos e inimigos. Não passo de um escrevinhador.
Deixo, portanto, aos profissionais, a tarefa de contar, com exatidão de números, nomes e conceitos, a história dos motéis de Feira de Santana, que não devem estar vivendo bons momentos nesse tempo de isolamento social, mas não sem antes deixar para eles, os historiadores do futuro, o registro de um fenômeno que é legitimamente feirense e pode ser, como foi a micareta para o carnaval, um divisor de água na trajetória desses equipamentos de entretenimento: a transformação, legal, de repartições públicas em motéis. É laissez faire que chama?
Ah, e antes que você maldoso leitor, maldosa leitora,… a foto não foi feita in loco, é meramente ilustrativa, capturada da milagrosa internet.
Bom final de semana.