
1.
Penso, às vezes, que as coisas não têm sentido.
A vida é só um rio raso que segue por seguir.
E cansa. E estagna.
Às vezes sinto-me estagnar, como esses rios.
E que estou mais velho.
E eis que ouço uns trovões.
A tarde é morna e irrita. Que venham
os trovões.
Ainda borboleteiam as borboletas,
canta o velho bem-te-vi. E o céu plúmbeo
é belo.
/Mas já esvoaça aquela borboleta
e cala o pássaro.
Só há o vento. O vento imenso
e as árvores.
Este é o sentido.
2.
( Não vejo sentido nas coisas do mundo.
Não que tenham sentido, porque não há sentido.
Não é preciso haver sentido.
Existir é só existir – e estamos quites.
Mas quero dizer que não vejo sentido nas coisas do mundo.
Estou aqui, olhando o vento nas árvores e os trovões
– e ontem não havia vento nas arvores nem trovões
e amanhã não deve haver vento nas árvores nem trovões.
Só hoje, só agora há tudo isso. E não compreendo.
Ou compreendo.
Por que hoje há trovões e vento e ontem não havia
e não haverá, por certo, amanhã?
Sim, sei: não há que ter sentido.
O mundo é isto. Só isto.
E mesmo o vento e os trovões já passaram.
E aquela borboleta e o bem-te-vi loquaz
retornam à cena.
Como isto é claro! )
Antonio Brasileiro
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