À distância, os dois trabalhadores pareciam flutuar no ar, com o casario da Queimadinha ao fundo e, mais além, do centro da cidade. Mas não era nada disso: estavam aboletados numa nova antena – essas antenas parecem sempre surgir do nada – e faziam um trabalho qualquer, muito concentrados. De longe, pareciam imóveis. Às vezes vibravam algumas pancadas e o som metálico feria o silêncio da manhã.
Em volta, grandes blocos de nuvens cinza-esbranquiçadas – cumulus nimbus – arrastavam-se pelo céu e, sob elas, o voo concêntrico de uma dezena de urubus. Farejavam carniça e, aos poucos, iam aterrissando, naquela dança simétrica e tristonha. Excepcional no céu, na manhã, só quatro ou cinco ferozes bem-te-vis afugentando um carcará.
É mais uma torre de comunicação instalada na Feira de Santana. Percorri com o olhar o entorno e notei que há dezenas delas espalhadas pelas cercanias. Antigas, recentes, esguias, bojudas, pintadas de vermelho e branco ou sem cor, emitindo ou não uma luz vermelha, intermitente e melancólica, à noite. Imagino que sirvam para os múltiplos usos da tecnologia moderna: rádio, televisão, telefonia, telecomunicações.
No quesito antenas a Feira de Santana mudou muito nas últimas décadas, acompanhando as radicais transformações que vieram no bojo da tecnologia moderna. Antigamente, destacavam-se as antenas das emissoras de rádio, agudas e muito visíveis, porque não existiam edifícios na Princesa do Sertão. No mais, o que havia, nos quintais, eram aquelas antenas domésticas para captar sinal de tevê, intrincadas e pesadas geringonças.
Com o tempo – e a disseminação dos aparelhos de telefonia celular a partir de meados dos anos 1990 – as antenas foram se proliferando, pontuando a paisagem feirense. Por fim, o avanço avassalador do universo digital tornou-as corriqueiras, essenciais para uma vida cada vez mais on line. Pela janela aberta vejo, próxima, a que abrigava os dois trabalhadores e, à distância, uma maior, pomposa, solene.
Nos anos 1980, impressionava aquela que ficava na sede da extinta Telebahia, quase no cruzamento da Maria Quitéria com a Getúlio Vargas. Seu porte, sua intrincada estrutura metálica e seus imensos repetidores inspiravam respeito nos tabaréus daqueles tempos. Colossal na cidade quase sem edifícios altos, destacava-se, portentosa, à distância.
Lembro que, num remoto final de tarde, depois de um evento profissional, bebericava uma cerveja às margens do São Francisco, em Juazeiro. De lá, apreciávamos a orla de Petrolina, as luzes se acendendo à medida em que a tarde morria. Faiscavam as lâmpadas miúdas das antenas de telecomunicações, sobrepondo-se até à Catedral de Petrolina. Foi quando um colega observou:
– No passado, as torres das igrejas se destacavam, eram o que havia de mais alto. Hoje, são as antenas de telecomunicações. Acho que elas, e aquilo que elas representam, é que vão mandar no mundo. A igreja já era…
O raciocínio tinha ambição modesta, frase retórica, de mesa de botequim. Mas ficou faiscando, como as luzes vermelhas das antenas, que se acendem e se apagam, se acendem e se apagam…
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