Maria Barbuda vendia comida dentro do Mercado. Negona volumosa, tinha fama de valente e de ser dotada de poderes mágicos.O Barbuda era da família portuguesa a quem pertenceram seus avós escravizados. Morava na Galiléia, vinha andando, carregando troços da cozinha. Um dia jogou uma macumba em um motorista: ele só conseguiu consertar o caminhão quebrado na ladeira do Najé depois de pedir desculpa pela grosseria que havia feito, a buzina estridente, o esculacho, pra ela sair do meio da estrada poeirenta que ele vinha de longe, talvez do Rio Grande do Norte. Havia também um vendedor de brilhantina a granel, cuja fórmula não passava da vaselina com um corante, os baleiros que falsificavam chocolates, Pedro Grosso que levantava uma camionete no ombro, os engraxates roubando tabaréus e coronéis contratando para vinditas e grilagens os pistoleiros travestidos de vendedores de carros velhos. No centro da cidade havia também o Café São Paulo. Algumas histórias o folheteiro Jurivaldo ouviu falar, outras ele viveu. Por exemplo, a vida de propagandista: se deixar, ele conta uma história em cima da outra do tempo em que fabricava e vendia remédios, xaropes e outros curativos. Ganha-pão de artistas da persuasão e do espetáculo numa época em que as performances e shows não eram banalidades. Ciência, poesia, jogo, misticismo, tudo na arte do camelô propagandista para fazer a roda, nas feiras. Não era só na feira grande da Feira.Não. Os propagandistas iam onde não haviam as farmácias ainda, iam longe. Jurivaldo fala como um teclado apressado, escrevendo a própria história e a da Feira dos anos 60-70 antes da feira-livre ser deslocada para o Centro de Abastecimento naquele vaticinado ano de 1977.
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