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Nota dos editores: O Blog da Feira inicia hoje a série Textos Polítikos, composta por artigos que analisam a situação política e social de Moçambique, país africano de língua portuguesa com profundas conexões históricas, políticas e culturais com o Brasil, especialmente com a Bahia. Os textos são assinados por Mwanene, moçambicano graduado em Humanidades pela Universidade Federal da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB), instituição que mantém um campus no município baiano de São Francisco do Conde.
Ao longo da série, o leitor encontrará em Mwanene um observador atento das dinâmicas do poder político moçambicano. Embora fortemente crítico do status quo, Mwanene acredita na transformação social e na possibilidade de uma revolução fundamentada na conscientização política e no fortalecimento das práticas democráticas, superando, assim, os traumas e desafios herdados da luta pela independência.
Publicada com exclusividade pelo Blog da Feira todas as segundas-feiras, Textos Polítikos busca provocar o debate sobre os desafios e as perspectivas para um futuro mais justo e democrático em Moçambique. Agradecemos a valiosa colaboração de Mwanene, assim como a intermediação essencial de Laila Beirão, professora de filosofia, mestra em Estudos de Linguagens e colunista do Blog.
Moçambique é um país que, desde sua independência, tem vivido sob um regime político que mais se assemelha a um teatro de aparências do que a uma verdadeira democracia. A Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), que ocupa o poder desde a conquista da independência, em 1975, tem se mostrado incapaz de oferecer soluções eficazes para os graves problemas sociais que afetam a população. A falta de avanços substanciais nas áreas essenciais, como saúde, educação e infraestrutura, tem deixado a maioria da população à mercê de um sistema que perpetua desigualdades, enquanto a política de medo é usada como ferramenta para silenciar qualquer forma de oposição. A situação exige uma reflexão profunda sobre a necessidade de mudanças reais, que envolvem tanto o modelo de governança quanto as práticas políticas no país.
A Frelimo, desde sua ascensão ao poder, tem se caracterizado por um discurso político voltado para a manutenção da estabilidade e do desenvolvimento. No entanto, o que se observa na prática é um constante afastamento das promessas de transformação social. As grandes questões que afligem a sociedade moçambicana, como o acesso a uma educação de qualidade, o atendimento básico de saúde e a construção de infraestrutura essencial para o desenvolvimento econômico, continuam a ser problemas crônicos sem soluções eficazes. Em vez disso, o governo prioriza projetos que visam apenas agradar a elites políticas e empresariais, enquanto a maioria da população continua sem acesso a serviços básicos e vive em condições precárias.
A falta de progresso nessas áreas essenciais revela a natureza de um regime que se distancia cada vez mais das necessidades reais do povo. A promessa de um Moçambique próspera e justa se esvai diante da realidade de um país marcado pela desigualdade e pela concentração de riqueza nas mãos de poucos. Além disso, a falta de transparência nas ações do governo e a constante manipulação dos processos eleitorais dificultam qualquer tentativa de mudança ou renovação política. A Frelimo, em vez de se renovar e buscar soluções inovadoras para os desafios do país, mantém-se presa a velhas práticas políticas que não atendem às demandas da população.
Outro aspecto fundamental da política moçambicana é o que chamo de “política do medo”. Este conceito se refere ao uso de mecanismos repressivos para silenciar a oposição e qualquer forma de dissidência política. A liberdade de expressão é constantemente ameaçada, com jornalistas, ativistas e opositores políticos sendo alvo de perseguições, prisões arbitrárias e até ameaças de violência. A manipulação das instituições do Estado, como o Judiciário e a polícia, é uma prática comum, o que impede que a justiça seja realmente acessível para aqueles que se opõem ao governo. Esse clima de intimidação gera um ambiente de insegurança e submissão, no qual muitos cidadãos preferem se manter em silêncio, temendo represálias.
A política do medo não apenas enfraquece a democracia, mas também impede que o país avance em sua busca por justiça social e igualdade. Sem um espaço livre para o debate e para a crítica, as possibilidades de crescimento e transformação são severamente limitadas. A população, ao ser forçada a viver sob esse regime de silêncio e repressão, acaba se tornando refém de um sistema que não responde às suas necessidades.
É urgente que Moçambique enfrente uma mudança significativa em sua estrutura política e social. A democracia deve ser mais do que uma fachada; ela precisa ser vivenciada no cotidiano das pessoas, com o compromisso real de resolver os problemas que afetam a população. A mudança não pode se limitar à troca de líderes, mas deve envolver uma revisão profunda das políticas públicas, com foco no bem-estar social e no fortalecimento das instituições democráticas. A luta pela liberdade de expressão, pelos direitos humanos e pela igualdade social deve ser um objetivo central para qualquer movimento político que pretenda representar verdadeiramente o povo moçambicano.
Em síntese, Moçambique está em um momento crítico, em que as falsas promessas da Frelimo e a política do medo têm minado o potencial do país. A política de intimidação e a falta de soluções concretas para os problemas estruturais do país não podem mais ser sustentadas. Para que Moçambique avance, é essencial que haja uma mudança no governo, com a implementação de políticas que atendam às reais necessidades da população e promovam a verdadeira democracia. O país precisa de uma liderança que não apenas faça promessas vazias, mas que tenha coragem de transformar as condições de vida da população e garantir um futuro mais justo e igualitário para todos.