Carta aberta do Movimento Nacional da População de Rua (MNPR) – Núcleo Feira De Santana
O Movimento Nacional da População de Rua (MNPR), organização civil presente em 19 Estados brasileiros, vem por meio desta carta solicitar do poder público municipal de Feira de Santana iniciativas frente à atual conjuntura do Coronavírus em nosso município. Levando em consideração que a população em situação de rua se torna ainda mais vulnerável diante da pandemia do Covid-19, e o poder público junto à SEDESO – Secretaria de Desenvolvimento Social não divulgou medidas para minimizar a condição de vulnerabilidade dessas pessoas, viemos por meio desta carta acionar os agentes públicos para que adotem medidas de Proteção Social Básica (PSB) destas pessoas.
Como é de conhecimento público, nossa cidade é marcada por um relevante contingente de pessoas em situação de rua. Trata-se de centenas de jovens, adultos, mulheres, homens, crianças, idosos, homoafetivos, feirenses, de outras cidades, de outros países, que fazem das ruas de Feira de Santana o único local de moradia e sobrevivência, ainda tendo de enfrentar a crise sanitária global do Coronavírus.
Essa condição expõe por si só a ausência de direitos básicos previstos em nossa legislação. O descaso governamental histórico direcionado para essa fração social agrava suas condições de existência, acentuado as mais diversas possibilidades de vulnerabilidade social-psíquico-biológico-econômico-cultural.
Esse cenário se complexifica, ainda mais, quando adicionamos o atual horizonte referente à pandemia do Coronavírus. Sabemos que o primeiro caso do Nordeste foi detectado em Feira de Santana, um indicativo substancial da possibilidade de disseminação do vírus em nosso município. Entendemos que algumas medidas estão sendo realizadas para a contenção do contágio, todavia, não identificamos atividades voltadas para as pessoas em situação de rua.
Vale salientar que as medidas indicadas pelos órgãos governamentais competentes direcionam-se majoritariamente para o recolhimento domiciliar, estratégia amplamente disseminada para contenção da doença. Mediante essa metodologia, cabe-nos perguntar: as pessoas que não têm para onde ir, não dispõem de um local para se abrigar, o que farão?
Há muito tempo, o município de Feira de Santana negligencia o direito à moradia previsto no art. 6 de nossa constituição. Tampouco efetiva as políticas previstas no decreto 7053/2009. Os setores de abrigamento, equipamentos de relevância para as pessoas em situação de rua, não atendem ao quantitativo necessário. Pesquisas de cunho local apontam para a necessidade de centenas de leitos, no entanto, dispomos apenas de uma unidade de “acolhimento” com capacidade para 30 pessoas.
O descaso se agrava com o silenciamento dos equipamentos e serviços voltados para as pessoas em situação de rua, como também pelo não cumprimento da lei Estadual 12.947/2014 e lei municipal 3482/2014. Quais medidas o Centro de Referência Especializado para Pessoas em Situação de Rua (Centro POP) está construindo para a conscientização e prevenção de uma doença que afeta de forma coletiva nossa sociedade? No que diz respeito à promoção do cuidado, quais iniciativas estão sendo realizadas pelo Consultório na Rua? Faz-se necessária uma atuação conjunta e emergencial, envolvendo as secretarias responsáveis. Atividades informativas, distribuição de insumos preventivos (álcool em gel, água potável, medicamentos), formas de garantir a segurança alimentar, assim como a criação de modalidades de abrigamento são metodologias indispensáveis para enfrentamento da atual realidade que vivemos.
Além dos questionamentos, e sendo propositivo enquanto MNPR, gostaríamos de destacar que já existem ações que estão sendo tomadas em outras cidades brasileiras a fim de resguardar a saúde dessas pessoas:
1) Em João Pessoa, a prefeitura iniciou a distribuição de marmitas para população de rua de forma gratuita;
2) Em Natal, a Secretaria de Saúde lançou um documento com Orientações para os profissionais do Programa Consultório na Rua sobre a COVID 19;
3) A Defensoria Pública da União no Rio Grande do Norte recomendou ao poder público a concessão de auxílio-moradia às pessoas em situação de rua que necessitem cumprir as medidas de quarentena ou isolamento domiciliar;
4) A Defensoria Pública da União no Distrito Federal recomendou a utilização dos equipamentos públicos esportivos (estádios, ginásios e centros de treinamento) e educacionais (escolas, centros de ensino e faculdade) com alguma estrutura sanitária para abrigar e permitir a higienização daqueles que se encontram nas ruas e sem moradia.
Diante do exposto, nunca é demais lembrar que o art. 196 da constituição federal salienta que a saúde é um direito de todos. O descumprimento de tal prerrogativa não só afeta a vida das pessoas que estão nas ruas, mas interfere diretamente no atual momento. Desta maneira, cobramos dos agentes governamentais a inserção da população em situação de rua nas metodologias de combate e prevenção do Coronavírus, entendendo que a suplementação desse momento pandêmico necessita de um esforço inclusivo e macro, principalmente, para as populações urbanas em vulnerabilidade social.
Maria Lúcia, Presente! Conhecer para Lutar!
Movimento Nacional da População de Rua – Núcleo Feira de Santana