
Foi dantesca a cena de Jair Bolsonaro, o “mito”, ajoelhado ontem em Brasília. Antes, o “messias” encarou, estoico, um suposto jejum. Segundo ele e os mercadores da fé que o secundam, todo o sacrifício foi para que Deus – o provedor eterno – afaste o coronavírus destes tristes trópicos. O mundo civilizado enfrenta a pandemia com ciência e tecnologia. Aqui, abraça-se um primitivismo constrangedor. Fico imaginando que futuro espera o Brasil, lá na frente, caso essa insanidade campeie por muito mais tempo.
Defronte aos acólitos da sua seita profana, o “mito” ameaçou de demissão, mais uma vez, o ministro da Saúde, Henrique Mandetta. É tão covarde que sequer teve coragem de mencioná-lo. Aquilo não foi uma demonstração de força, mas de fraqueza: já que dispõe de tanto poder, por que o “mito” não o exonera logo? No posto, pode alocar um dos mentecaptos ideológicos que o cercam.
A valentia tem prazo de validade: em duas ou três semanas o Brasil vai se aproximar do ápice da pandemia. Serão muitos mortos – milhares – e o abalo deve deixar o “mito” falando mais sozinho do que já está. A não ser, claro, que uma intervenção divina cesse a pandemia. Mas só os mais entusiasmados membros da seita herética que está aí na praça apostam nisso.
Caso a insanidade se arraste por muito mais tempo, o custo, em vidas humanas, pode ser brutal. Perplexo, o brasileiro prudente sabe que, para ele, só há uma alternativa: ficar em casa, porque na rua o risco de contaminação é assustador. Mas isso é para os felizardos que tem esta alternativa. E os brasileiros que marcham na informalidade, desempenhando ofícios precários e mal remunerados?
Para esses o governo já deveria ter liberado a ajuda de R$ 600 – a proposta inicial da turma do “mito” era de ínfimos R$ 200 –, mas nem notícia. A desorganização, a incompetência, o pouco-caso com os mais pobres retardam a liberação. Antes sinalizavam com o 16 de abril – data longínqua – como prazo. Agora, nem isso.
Gente atenta especula se o “mito” não alimenta a tresloucada fantasia de, com o atraso, provocar saques e depredações que facilitem o autogolpe que ele insinua com tanta frequência. O problema é que boa parte da elite econômica e a própria classe média estão sem paciência com o “messias” do Vale do Ribeira. Sinal de que sua popularidade está se erodindo.
Mas é bom não duvidar: quem acha que com jejum e genuflexões é possível erradicar uma pandemia, é capaz de fantasiar muita coisa…
Foto: Folhapress
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