
Vai de gengibre? – Doralice pergunta mas já sabe. Sem esperar resposta colocou a dose no balcão, virou-se para atender aos outros e aumentou o volume da música.“… te dei carona pra rodoviária e vi você partir, pode ir….”. Quando voltou pra lhe dar atenção ele ainda não havia tocado no copo, tinha uma perna sobre o banco, a outra no chão, e o olhar fixo na direção do mercado, completamente desligado.
– Acorda pra vida, homem, que a semana já começou!, brincou, tentando tirá-lo da maresia e crente que se tratava apenas de mais uma ressaca. Enganou-se.
Os outros clientes habituais foram chegando, ela entreteve-se com o trabalho e esqueceu a casmurrice de Bão, seu cliente das antigas desde o tempo da outra barraca perto do G. Barbosa.
Duas horas depois, ele já não estava, o jornalista falou do acontecido, devorando gulosamente uma passarinha acompanhada com porções elefantescas de molho de pimenta braba, regada a cerveja estupidamente gelada que junto com o gengibre faz da barraca dela uma referência da Marechal.
Ela juntou as pontas, desamarrou os nós, passou no fundo da agulha e teceu a história para si, sem dizer nada ao jornalista, curioso e falador como todos são, que essa era a causa daquele estranhamento de Elesbão da Cebola, conhecido ali no trecho como Bão, freguês das antigas, bebedor de gengibre desde o tempo da outra barraca perto do G. Barbosa.
Boca fechada não entra mosca, pensou.
Nesse mesma tarde, coisa do destino juntar todo aquele povo ali numa segunda-feira, vieram comer maniçoba o tenente Brandão, o fotógrafo Tracajá com três ou quatro pariceiras, o árabe Jamil, a cantora Kareen Mendes e o radialista Elsimar Pondé. Como o jornalista comedor de pimenta, todos já sabiam do sequestro e era só no que falavam.
Mais tarde quando trancou a bodega resolveu ir falar com dona Cleia e saber da boca dela como era mesmo essa história antes de admitir a certeza de que Bão estava metido naquele furdunço. Pensou, e agiu, tomando o rumo do Beco da Energia.